domingo, 23 de outubro de 2011

Rainha[(s)]: Duas atrizes em busca de um coração (SP)


Foto: Roberto Selton

Histriônicas

Retomemos a forma como espetáculo ”Rainhas” preenche o tempo (1h30min):

1) Duas personagens atrizes chegam atrasadas ao teatro. Apresentam motivos para o atraso e começam a se organizar para a peça que hão de apresentar.

2) Um conflito entre as duas personagens aparece. Há pequenas rixas, disputas, problemas de relacionamento não resolvidos. A história começa a nos prender. Será que daí surgirá Mary Stuart e Elizabeth I?

3) Efeitos de luzes. Alguém começa a ler o texto de Schiller. O ritmo cai. Mary Stuart surge. O ritmo fica palatável novamente. Há uma projeção no chão do palco de um coração pulsante. Antes, um coração é estourado e sangue jorra.

4) As atrizes voltam para a casa inicial com piadas sobre o teatro, a montagem, a interpretação. Momentos cômicos compartilhados por quem faz teatro, ou quem é próximo dele. Aos demais, é pouco mais que risonho.

5) Um longo vai e vem. Com vestidos, elas interagem com as personagens clássicas. Uma contra-regra traz os ingredientes e sangue falso é produzido e, depois, lava as mãos de uma das atrizes. Interrupções: comentários sobre a arte do ator no meio de interações narrativas. Quando a história vai começar, ela pára. Quando pensamos que a parada é a história, Mary e Elizabeth surgem novamente.

6) Uma grande cena do clássico. Izabel Teixeira (Mary Stuart) tem uma excelente interpretação da rainha escocesa.

7) Enquanto a personagem-atriz de Teixeira come uma maçã, a personagem-atriz de Gerogette Fadel dá voltas no palco fazendo nada além de graça. Se durasse duas voltas, era interessante. Parece que dura umas cinqüenta. Ou mais. Me perdoem a ofensa, mas é nada além de macaquice. Quem se sente ofendido com perda de tempo sou eu. Para mim, o teatro é importante demais para ser desperdiçado. E tenho pena do senhor de cabelos brancos ao meu lado mal acomodado na cadeira, provavelmente pensando nas poltronas de veludo vazias na platéia do São Pedro.

8) Nova cena do clássico, Teixeira e Fadel reinam como Mary e Elizabeth numa mostra do grande talento que ambas atrizes trazem a Porto Alegre. Fadel, no entanto, demora para entrar na Rainha, permanecendo com o sarcasmo da atriz-personagem. É o momento mais brilhante entre as duas.

9) A peça termina com as Rainhas. E a gente fica sem saber para que é que todo o alvoroço em cima das construções das personagens-atrizes foi realizado.

“Rainhas” agrada. As atrizes são simpáticas. O figurino é potente. As luzes e a disposição da assistência propõe relações interessantes. A trilha é executada ao vivo por um pianista que interpreta lindamente as canções. As próprias atrizes cantam muito bem. Há recursos recuperados de forma bastante criativa: a votação por qual rainha queremos que morra, o sangue fresco, o coração, o vestido, o talco...Um carrinho de supermercado cheio de coisas caras, valiosas, lindas e saborosas é o que o espetáculo parece ser! Dirigido, no entanto, por alguém que, embora com cash para pagar por tudo, parece não saber nem mesmo fritar um ovo. Em resumo: não há nada que mova o espectador a continuar assistindo ao espetáculo que, embora se apresente como dramático, não faz curva, não desenvolve os problemas que propõe, nem realiza efetivamente a contagem de uma história. É um sem fim de coisas novas e inúteis jogadas no chão sem motivo, nem futuro.

O tempo, assim, não é preenchido como falei no início. É gasto, quando muito, de forma engraçadinha.

*

Ficha técnica
Baseado na obra de Friedrich Schiller
Dramaturgia: Isabel Teixeira, Georgette Fadel e Cibele Forjaz
Direção: Cilbele Forjaz
Assistência de direção: Luana Gabanini
Elenco: Isabel Teixeira, Georgette Fadel
Cenografia e figurinos: Simone Mina
Iluminação: Alessandra Domingues
Direção musical: Lincoln Antonio
Direção de cena: Elisete Jeremias
Pianista: Rodrigo Vasconcelos
Músicas: Lincoln Antonio, Manuel Pessoa, Walter Garcia e John Dowland
Canção “leve meu coração”, de Celso Sim
Preparação corporal: Tica Lemos
Direção de produção: Henrique Mariano

*Texto escrito em setembro de 2009 por ocasião do 16º Porto Alegre em Cena

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