sábado, 4 de agosto de 2012

Navalha na Carne (RJ)


Foto: Leo Palomo

Um ótimo e sempre bem vindo Plínio Marcos

            Eis aí um belo Plínio Marcos. Para ser bom, é preciso que o espectador saia com “um bolo no estômago”, um descrédito aos relacionamentos, uma vontade de viver sozinho, uma desesperança a respeito dos humanos. Este é o universo marginal do dramaturgo santista (1935-1999), que constrói os personagens totalmente imiscuídos na situação em que vivem, fora de qualquer moral, à parte de qualquer culpa ou de classificação de herói ou de vilão. A prostituta Neusa Sueli, o cafetão Vado e o servente Veludo agem por instinto, como animais sem saída, nem coitadinhos, nem responsáveis. Dirigido por Rubens Camelo, a montagem estreou em 2010 e agora está de volta a cartaz na Sala Rogério Cardoso da Casa de Cultura Laura Alvim. Com ótimas interpretações de Marta Paret, de Rogério Barros e de Danilo Watanabe, a produção é uma excelente opção para quem gosta de bom teatro.
            As interpretações de Marta Paret e de Rogério Barros surpreendem por fugir dos convencionais Neusa Sueli e Vado. Paret, que é uma mulher bonita, está bonita também em cena, afastando-se dos costumeiros cabelos desgrenhados e roupas amassadas das montagens tradicionais. O estranhamento inicial do espectador acostumado é ultrapassado pela forma como a atriz dosa as intenções, começando bastante sutil, quase irresponsável no início para, depois, aos poucos, trazer à tona toda a profundidade da personagem. O final avassalador é o ápice de Plínio Marcos no melhor momento dessa valorosa produção. Barros constrói um Vado fleumático, com gestos quase coreografados e um quê de afetação, distanciando-se da máquina feroz do Vado usual. A opção, que é muito bem desenvolvida, dá lugar para um personagem que surge como contraponto para Neusa Sueli-Veludo, o que é bastante interessante como marca de um teatro vivo e sem receitas prontas. Watanabe é forte em cena como prevê uma ótima interpretação de Veludo, oferecendo uma excelente participação.
            A sensação de sufocamento é absolutamente essencial para a boa fruição de Plínio Marcos. O texto, cortante como uma navalha, tira o ar e é preciso que ele pareça mesmo ter sumido para o constrangimento ganhar lugar na catarse aterradora do realismo naturalismo. O Porão da Laura Alvim é lugar eficaz pra isso, mas encontra, felizmente, um ótimo trabalho de cenografia e de iluminação (Paulo Denizot), além de uma trilha sonora que jamais é desligada e não abre positivamente lugar para o vazio.
            Lá pelas tantas, Neusa Sueli pergunta: “Somos gente?”. Esse é o grito do pior que há dentro de nós e, ao mesmo tempo, do maior trunfo do ser humano: ser também um animal. Parabéns!

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FICHA TÉCNICA
Texto: Plínio Marcos
Direção: Rubens Camelo
Elenco: Marta Paret, Rogério Barros e Danilo Watanabe
Iluminação: Paulo Denizot
Trilha Sonora: Gabriel Fomm
Figurino: Jackie Sperandio
Direção de Arte: Marta Paret, Rogério Barros e Rubens Camelo
Programação visual: Rogério Barros
Fotografia: Leo Palomo
Assessoria de imprensa: Barata Comunicação

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