segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Primeiro Amor (RJ)

Foto: divulgação

Ana Kfouri e Antônio Guedes: um Beckett bem feito!


             Com direção de Antônio Guedes, em cartaz no Teatro Poeirinha, Ana Kfouri interpreta "Primeiro Amor", de Samuel Beckett (1906-1989) com força, com coragem e com determinação. Surgido como conto nos anos 40, a obra veio antes de serem escritos os clássicos “Esperando Godot”, “Fim de Jogo” e “Dias Felizes”, as mais conhecidas do autor. Desde lá, o dramaturgo irlandês já traduzia em arte a solidão como maior desafio do homem contemporâneo. Para quem gosta de sutilezas, é uma ótima opção. Pra quem gosta de palavras afiadas, é um excelente programa. Para quem gosta de reflexões profundas, é uma pauta imperdível.

Para o homem do texto, a solidão para não é uma escolha, mas uma prisão dentro da qual ele foi colocado sem se lembrar qual foi o crime que cometera. Ser e estar, para Beckett, são sinônimos e o tempo é as grades desse ser/estar só. “Primeiro Amor” começa em um cemitério com a morte de um pai e termina com o nascimento de uma criança, um filho. O amor está bem no meio quando o personagem se encontra com uma mulher. Só em um banco, em um universo árido, em tons escuros e uma projeção bastante clara, Ana Kfouri tem poucos recursos a mão para dar vida a essa figura cheia de profundidade. É nesse pouco que vê-se o seu muito. Os olhos e as faces do rosto são exploradas de diversas formas, em vários níveis e, assim, são responsáveis por momentos de aceleração e de pausa no ritmo que evolui para o fim em crescente. As palmas das mãos estão sempre abertas, os dedos sempre separados com os braços avançando para cima e para baixo como que marcando o compasso desse tempo cujo passar é cada vez mais trágico. Então, inesperada e surpreendentemente, Kfouri fica em pé e o espectador sabe que estamos no ápice. As palavras, martelando na boca da história, permanecem transbordando mesmo quando é silêncio. E elas saem sem um motivo claro, uma motivação específica. Elas saem. 

Os vídeos de Helena Trindade expressam a relação entre as palavras e seus significados e significantes. As letras são vistas como cenário onde os significados podem acontecer ou não. O absurdo é a ausência de lógica e o amor é sentido apenas na ausência da pessoa amada. A iluminação, que proporciona um jogo de sombras, uma relação entre positivo e negativo, luz frontal e contra, cadencia o ritmo da história e no seu pouco também faz muito. “Primeiro Amor” é, assim, um todo coeso e coerente, que se utiliza da falta de lógica como sua própria lógica de articulação. Não significar é significar. 

É preciso ter coragem para assistir a Beckett e mais ainda para fazê-lo. Nele está a chave para a compreensão sobre o hoje, o espelho de uma época que ele, enquanto homem deste mundo e falecido há duas décadas, nem chegou a experimentar. Palmas! 

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Ficha Técnica

Texto Samuel Beckett
Tradução Célia Euvaldo
Concepção Antonio Guedes
Atuação Ana Kfouri
Assistente Flávia Naves
Vídeos, Identidade Visual e Projeto Gráfico Helena Trindade
Assistente de Design Gráfico Patrícia Gerstner
Sonoplastia Antonio Guedes
Assistência Técnica de Vídeo Renato Livera
Comercial de TV/Filmagem Eduardo Chamon
Assessoria de Imprensa André Gomes
Fotos de Divulgação Dalton Valerio
Operador de Som, Luz e Vídeo Walace Furtado
Cenotécnica Carlos Augusto Campos e Leandro Ribeiro - Articulação Cenografia
Controller Rodrigo Gerstner
Assistentes de Produção Simone Vidal e Taty Maria
Direção de Produção Ana Paula Abreu e Renata Blasi
Produção Diálogo da Arte Produções Culturais
Realização Cia. Teatral do Movimento
Idealização Ana Kfouri

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