quarta-feira, 13 de março de 2013

Como vencer na vida sem fazer força (RJ)

Luiz Fernando Guimarães, Gregório Duvivier,
Adriana Garambone e André Loddi são estrelas do
novo musical de Möeller e Botelho
Foto: divulgação

Os "Reis dos Musicais" vencem mais uma vez sem fazer força

“Como vencer na vida sem força” pode ter sido uma prova de fogo para a dupla Charles Möeller e Cláudio Botelho. Não é uma peça conhecida, as músicas são estranhas (no sentido de que não há um hit de que se lembre facilmente), a história é esquisita e, além de tudo, a escolha por Luiz Fernando Guimarães e por Gregório Duvivier para protagonistas de um musical foi absolutamente inusitada e corria o risco de ser também constrangedora. Como toda obra de arte, o novo musical da dupla conhecida como os “Reis dos Musicais” não deve ser avaliado a partir de uma comparação com outras obras, mas na medida em que venceu os próprios desafios. Nesse sentido, eis aqui uma análise que quer sugerir alguns motivos pelos quais esse espetáculo merece aplausos esfuziantes, bem como seus realizadores. 

O overture começa e um limpador de janelas (J. P. Finch/Gregório Duvivier) aparece lendo um livro de auto-ajuda (“How to succeed in business without really trying?”, de Shepherd Mead, verdadeiramente lançado nos Estados Unidos em 1952). O manual é sobre como vencer na carreira profissional e, obedecendo-lhe, Finch escolhe uma grande empresa, a World Rebimboca Company, para dar início a sua caminhada ao sucesso. Por sorte do destino, assim que o jovem chega para se candidatar a uma vaga, esbarra no presidente geral da companhia (J. B. Biggley/Luiz Fernando Guimarães). Em seguida, também por acaso, tropeça no diretor de Recursos Humanos, que o confunde com um amigo do “chefão” e, por isso, contrata-o na hora para uma vaga ínfima. Começa, assim, para Finch, uma escalada ambiciosa dentro da empresa, pautada pelos conselhos do livro que segue sendo lido pelo personagem principal. 

As cenas iniciais deixam claro que o roteiro será uma união estapafúrdia de deus ex machinas (quando acontecimentos surgem do nada para salvar o herói) e, para piorar, vêm ao palco o número do “Café”, fazendo pressupor que a peça (quase três horas de duração) será uma galeria monótona de situações comuns no mundo empresarial. Paira ainda o fato da montagem ser protagonizada por dois ótimos comediantes, mas que não são cantores profissionais. É quando, felizmente, as coisas começam a mudar. 

Eis que surge Andre Loddi, interpretando Bud, o sobrinho de Biggley, um ambicioso e relapso funcionário que se vale do parentesco para obter regalias e promoções no trabalho. Com uma excelente performance, Loddi é o primeiro a fazer o público se levantar do encosto da cadeira, seguido por Letícia Colin, que já havia aparecido, exibindo na continuidade sua voz potente e afinada, além de bom trabalho na interpretação da secretaria Rosemary, desde o início apaixonada por Finch e disposta a ajuda-lo. As experientes Gottsha (Smitty) e Ada Chaseliov (Srta. Jones), outras duas secretárias, aparecem também reforçando o time de bons cantores e bons atores, que começa a ser consolidado positivamente com as cenas cômicas de Duvivier e de Guimarães. O primeiro grande momento de “Como vencer na vida...” é, sem dúvida, o quadro do Setor de Correspondências, protagonizado por Fernando Patau (Twinble), Duvivier e por Loddi, acrescentando-se nela uma pujante coreografia de ótimos bailarinos (como o será em todas as outras cenas) desenhada por Alonso Barros. Além desse ser um grande número musical (a stravaganza faz parte do gênero comédia musical americana), neste momento, ficam-se claras, duas questões fundamentais que irão solidificar a narrativa: 1) que há para Finch um antagonista forte (Bud); e 2) que a união de vários deus ex machinas é justamente a piada da história, pois, parecendo tudo dar certo para Finch, “Como vencer na vida...” se torna um completo e maravilhoso deboche dos manuais de auto-ajuda. Para completar os pontos positivos que a produção finalmente traz, Adriana Garambone entra interpretando Hedy La Rue, a amante de Biggley, motivo principal dos melhores momentos do espetáculo, ao lado de Duvivier e de Guimarães, que ainda está começando aos olhos do espectador. 

Com uma belíssima iluminação de Paulo César de Medeiros, talvez aqui em seu melhor momento em grandes musicais, e com um cenário ágil, bonito, mas sobretudo inteligente (as estruturas que parecem ser de aço expressam de forma profunda a rigidez da grande companhia, o que será, por fim, contrariado pelo rumo da narrativa) de Rogério Falcão, a produção oferece ainda excelente qualidade musical, com direção de Paulo Nogueira e orquestra regida por Zaida Valentim. São valorosos os figurinos femininos e adequados os trajes masculinos de Marcelo Pies, destacando, mais uma vez, as excelentes coreografias de Alonso Barros. 

Na direção geral, Charles Möeller acaba por tirar vantagem de Gregório Duvivier e de Luiz Fernando Guimarães. Explorando o lado cômico dos dois conhecidos intérpretes, a direção surpreende o público colocando-os sem grandes problemas nos números musicais e de dança. Assistido por Bárbara Duvivier, Möeller mostra mais uma vez ter a habilidade de equilibrar o elenco dentro das possibilidades de cada um, puxando sempre o foco para o que há de mais positivo dentro das possibilidades que a produção lhe oferece. 

A versão brasileira assinada por Cláudio Botelho, da obra de Frank Loesser e de Abe Burrows, estreada na Broadway em 1961 e, pela primeira vez no Brasil, em 1964, encanta, diverte e solidifica a alta qualidade dos artistas brasileiros na produção de grandes espetáculos. “Como vencer na vida sem força” tem como principal mérito o de fazer com que uma história desconhecida e com músicas estranhas ganhe o coração e o ouvido do público, que sai cantarolando as melodias e certo de que teve ótimo entretenimento. A experiência dos realizadores substitui a força e dá-lhes vitória. Quem comemora somos nós. 

*

FICHA TÉCNICA


UM ESPETÁCULO DE
Charles Möeller & Claudio Botelho

MÚSICA E LETRAS
Frank Loesser

TEXTO
Abe Burrows, Jack Weinstock e Willie Gilbert

VERSÃO BRASILEIRA
Claudio Botelho

DIREÇÃO
Charles Möeller

ELENCO
Luiz Fernando Guimarães (J. B. Biggley)
Gregorio Duvivier (Pierrepont Finch)
Letícia Colin (Rosemary Pilkington)
Adriana Garambone (Hedy La Rue)
Andre Loddi (Bud Frump)
Fernando Patau (Twimble/Wally Womper)
Gottsha (Smitty)
Ada Chaseliov (Miss Jones)
Leo Wainer (Bert Bratt)
Cássio Pandolfi (Gatch / Toynbee)
Luiz Nicolau (Ovington)

Com: Cristiana Pompeo, Renata Ricci, Nadia Nardini, Carol Ebecken, Joane Mota, Kotoe Karasawa, Leandro Luna, Patrick Amstalden, Guilherme Logullo, Fabio Porto, Hélcio Mattos e Leo Wagner.

DIREÇÃO MUSICAL
Paulo Nogueira

CENÁRIO
Rogério Falcão

FIGURINOS
Marcelo Pies

ILUMINAÇÃO
Paulo Cesar Medeiros

DESIGN DE SOM
Marcelo Claret
VISAGISMO
Beto Carramanhos

COORDENAÇÃO ARTÍSTICA
Tina Salles

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Bem-vindo!