terça-feira, 9 de abril de 2013

A poltrona escura (SP)

Baseado em três textos de Pirandello, monólogo
estreou em 2003
Foto: Lenise Pinheiro

Trilogia Pirandello – segunda parte: Sem articulação

Em “A poltrona escura”, Cacá Carvalho está maior que Luigi Pirandello (1867-1936) e, por isso, o resultado não é bom. Uma vez que não há signo teatral, isto é, todos os signos são tornados teatrais, faz parte da identidade do teatro a sua característica congregadora. No momento em que o teatro se impõe, ele perde. Em cartaz no Mezanino do Sesc Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro, a peça é a segunda parte da Trilogia Pirandello, da qual também fazem parte os espetáculos “O homem com a flor na boca” e “umnenhumcemmil”. 

A dramaturgia assinada por Stefano Geraci une três textos do autor italiano: “Os pés na grama”, “O carrinho de mão” e “O sopro”, publicados nos livros “Berecche e la Guerra” (1919) e “Candelora” (1928) de forma não articulada. Ou seja, o espectador desavisado não tem instrumentos necessários para ver que, no palco, são três personagens diferentes em contextos, inclusive estéticos, diferentes, mas negativamente é convidado a pensar que trata-se de uma só persona em uma história mal escrita. Não há mudanças na interpretação de Carvalho e nem tampouco no cenário, no figurino, no desenho de iluminação, ou na forma como o ator se dirige ao público (encenação). O teatro, assim, amordaça os textos (Pirandello) sobre suas ordens (Bacci) em uma narrativa que dura quase duas longas horas (Geraci) em que o espectador, perdido, tenta dar sentido ao que, de fato, não faz sentido. 

Na primeira história, depois da morte da esposa, o marido vê-se abandonado no quarto dos fundos, abandonado pelo filho e condenado a se despedir de suas referências mais essenciais (os móveis da casa, por exemplo). Trata-se de um Pirandello realista, herdeiro de Ibsen no teatro psicológico europeu. Na segunda, um conhecido advogado expõe seu ranço com a sociedade que o cerca e confessa o meio de que se utiliza para se livrar da tensão: uma tara sexual, um segredo a ser guardado a sete chaves. Eis aí um Pirandello que, por estar mais próximo de Albee, pode ser facilmente lido como um dos iniciadores do teatro do absurdo que, décadas depois, será conhecido. Por fim, na última narrativa, que é mais próxima da segunda, há um homem que descobre ter um poder sobrenatural, capaz de tirar a vida de outrem com um gesto simples e discreto. O fato o torna senhor da morte e da vida alheia. Sem perceber as passagens de uma história para a outra, a plateia espera ansiosa pelo desfecho da primeira parte quando começa a segunda e das duas quando começa a terceira, acreditando que o todo é um ato só. “O senhor viúvo é quem tem o poder de matar? O advogado é o filho do senhor viúvo ou uma lembrança que ele tem de quando sua esposa ainda era viva?” Como uma novela mal resolvida, os núcleos são abertos, mas não se fecham claramente aos olhos de para quem o teatro é dirigido. Desse modo, é possível afirmar que “A poltrona escura” é um espetáculo fechado em si mesmo. 

Cacá Carvalho é um intérprete forte, potente e que conhece bem seu potencial expressivo. Sem um bom trabalho de direção, como é o caso aqui, o personagem único carece de marcas que valorizem forças, diferenciem tons, segreguem situações. Sem coesão, nem coerência, o trabalho nesse espetáculo parece histriônico demais, como que um portfólio das potencialidades do já renomado artista. É nele, em Carvalho, que se baseia a afirmação de que, nessa peça, o teatro parece querer ser mais forte que Pirandello. 

Sem articulação, elementos estéticos como figurino, cenário (ambos de Márcio Medina) e iluminação (Fábio Retti) aparecem insujeitos à avaliação, porque deslocados de uma estrutura que lhes dê suporte. Com estreia acontecida há dez anos, em 2003, a produção não agrada. 

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FICHA TÉCNICA - Trilogia Pirandello

COM: Cacá Carvalho

Direção: Roberto Bacci
Dramaturgia: Stefano Geraci
Cenário e figurino: Márcio Medina
Iluminação: Fábio Retti
Fotos : Lenise Pinheiro
Produção: Fondazione Pontedera Teatro
Realização: CASA LABORATÓRIO PARA AS ARTES DO TEATRO, FONDAZIONE PONTEDERA TEATRO/Italia
Gestão e Produção Executiva: Núcleo Corpo Rastreado
Assessoria de Imprensa no RJ: Lu Nabuco Assessoria em Comunicação
Produção no RJ: 3! Ideias e Soluções Culturais
Técnico de Luz: Yuri Cumer
Tradução: Cacá Carvalho
Arte grafica trilogia: orbi designer

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