terça-feira, 21 de maio de 2013

O caso da rua ao lado (RJ)

Comédia de Eugène Labiche não agrada
Foto: divulgação

Interpretações pesadas, comédia sem ritmo

“O caso da rua ao lado” (“L`Affaire de la rue de Lourcine”) é um espetáculo que exemplifica perfeitamente o fato de que nem tudo o que pretende o encenador ele consegue fazê-lo no palco. Dirigida por Marcus Alvisi, e apresentada como um vaudeville burlesque do francês Eugène Labiche (escrito em 1857 em colaboração com Albert Monnier e com Édouard Martin), a comédia está em cartaz no Teatro Maison de France, no centro do Rio de Janeiro. Eis o que o diretor diz no programa: “Certamente meu trabalho será criar o ambiente para que as ações e as motivações possam se desenvolver a partir dos atores, sem enfeites ou adornos. Apenas a concisão essencial que motiva o ator em cena. E a simplicidade de sua execução.” Apesar dessas intenções, a obra a que se assiste tem tudo menos concisão, simplicidade e livre atuação. O espetáculo não tem ritmo, todos os movimentos são partiturarizados, as reações não são espontâneas e, à título de exemplo, o lustre e os castiçais com velas, ao invés de iluminar, são iluminados, sendo nada além de mero enfeite no cenário. Mesmo assim, vale dizer, o espetáculo é divertido, o que prova a excelência de um dos maiores autores cômicos da história do teatro francês e mundial. Dele e de quase ninguém mais nessa produção. 

Um dia um homem, Lenglumé, acorda em sua cama sem lembrar do que aconteceu na noite anterior. Para seu espanto, há um desconhecido (Mistingue) ao lado dele, dormindo também. Ambos não sabem como vieram parar ali, mas os dois têm as botas sujas de lama e as mãos com marcas de carvão. No bolso de um, há uma touca de mulher e, no de outro, uma meia feminina. Engrossando a trama, à mesa, a Senhora Norine (esposa de Lenglumé) lê num jornal que, na última noite, houve um terrível assassinato em que uma jovem carvoeira fora assassinada com golpes de guarda-chuva. Certos de que são os assassinos, Lenglumé e Mistingue começam a percorrer as pistas que possam ter deixado e eliminar possíveis testemunhas. Em jogo que é próprio do vaudeville, a “roda da dramaturgia” gira em espiral, percorrendo os círculos maiores no início da narrativa, quando as bases são contadas, diminuindo a circunferência e aumentando a velocidade cada vez em uma subida crescente para o fim. O gênero, muito comum no século XIX e no início do século XX, ainda hoje garante bom entretenimento. O problema dessa atualização é a concepção da direção para cada um dos personagens e para a viabilização do jogo que deveria ocorrer entre eles e que não ocorre. 

Como já disse, tudo é muito lento, muito gestual, bastante próximo das caricaturas. O sotaque nordestino de Marco Amaral Correia (Lenglumé) e de Rober Vieira (o primo Potard) é negativamente forte, o modo como ACT Carvalho diz o texto (o mordomo Justin) é inverossímil dada a imensa quantidade de pausas e a ausência de expressão, isso sem falar nas feições enrijecidas de Correia e de Alexandre Beck (Mistingue), cujos movimentos são coreografados mais do que marcados. Porque é um personagem não-cômico e que representa o público diante dessa trama construída à base de mal-entendidos, o peso que recai sobre Dig Dutra (Norine) é menor. Consequentemente, é ela quem obtém o melhor resultado, principalmente porque, em alguns momentos, a atriz expressa uma construção bastante espontânea positivamente. 

Com exceção do belo vestido de Norine, os trajes usados pelos personagens na concepção de Rafaela Rocha são fiéis à época e ao lugar narrativo, estando a contento. Apesar do já citado lustre, o cenário de José Dias é igualmente positivo. Porque discreta, a iluminação de Carlos Lafert cumpre o seu papel. Em sentido exatamente oposto ao figurino, ao cenário e à iluminação, que tendem a desaparecer apontando para a narrativa, a trilha sonora assinada por Alvisi é terrível. Uma colagem oriunda de filmes de suspense torna pastiche ou trash o que é vaudeville, fazendo a obra debochar de si própria, desvalorizando a sua narrativa. 

O vaudeville tem o mérito na história de arte de ter dado para a comédia um lugar privilegiado que, ainda distante do drama, nunca havia tido até então. Nas histórias escritas dentro desse referencial, permanecem as críticas à sociedade e as tramas bem amarradas da farsa e da Commedia dell`Arte. São justamente as interpretações mais próximas do real além da narrativa que diferenciam. Infelizmente, é isso o que principalmente falta nessa montagem de “O caso da rua ao lado”. 

*

Ficha Técnica:
Texto - O Caso da Rua Ao Lado _ de Eugène Labiche
Tradução e Adaptação - Alberto Renault
Direção - Marcus Alvisi
Elenco - ACT Carvalho, Alexandre Beck, Dig Dutra, Marco Amaral Correia e Rober Vieira
Ass. Direção - Rober Vieira
Direção de Arte e Cenografia - José Dias
Ass. Cenografia - Paula Senra
Cenotécnico - Paulo Fernandes e Equipe
Luz - Carlos Lafert
Trilha Sonora - Marcus Alvisi
Operador de Som - Jean Demetrius Kosciukyewicz
Cadeiras - Ezequiel Pereira
Figurino - Rafaela Rocha
Maquiagem - Mona Magalhães
Direção de Produção - Caroline Alcova
Assessoria de Imprensa - Lu Nabuco Assessoria em Comunicação
Realização - Proscênio Teatral

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Bem-vindo!