quarta-feira, 29 de maio de 2013

O Lago dos Cisnes (RJ)

Depois de sete anos, "O Lago dos Cisnes" está de volta
ao palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro
Foto: divulgação

O Romantismo vence aqui o Melodrama com galhardia

Em quase cinco anos como crítico de teatro, assistindo em média a cinco produções cênicas por semana nesse período, não lembro de ter visto um espetáculo com tão belo cenário e figurino em tão bem articulado uso. “O Lago dos Cisnes”, produção do Ballet do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, com coreografia da russa Yelena Pankova, volta ao palco mais nobre da cidade depois de sete anos desde sua última temporada. Com majestosa regência de Silvio Viegas, a Orquestra Sinfônica acompanha o grupo de bailarinos e seus convidados especiais nesse espetáculo que inclui o Brasil na lista dos grandes produtores mundiais de peças de repertório pelo brilho com que chega à cena. Composta pelo russo Piotr Tchaikovsky (1840-1893) entre os anos de 1875 e 1876, “O Lago dos Cisnes” é considerado um divisor de águas na história do ballet clássico por trazer uma série de inovações ao gênero, entre elas os conhecidos “tutus”, sendo a mais popular peça de ballet romântico. Na produção, destacaram-se, na sessão de estreia, o disciplinado corpo de baile masculino e feminino, além das crianças. O destaque especial em solo foi para o excelente Cícero Gomes, intérprete do personagem “o Bobo”. Dirigido por Hélio Bejani, o grupo é vinculado à Fundação Teatro Municipal, cuja presidente é a cineasta Carla Camurati, da Secretaria de Estado da Cultura. O projeto dá seguimento à programação artística do TMRJ, essa elaborada pelo maestro Isaac Karabtchevsky. No elenco, estrelam, como convidados, a cubana Lorena Feijoo (Odette/Odile) e o brasileiro Vitor Luiz (o príncipe Siegfried), ambos do San Francisco Ballet. A produção fica em cartaz até 2 de junho na Cinelândia, centro do Rio de Janeiro. 

Transformada em um cisne pelo bruxo Von Rothbart (Carlos Cabral), a princesa Odette passa a viver no lago junto de outras meninas que passaram pelo mesmo feitiço. Todas elas só retornam à forma humana durante a noite, entre o anoitecer e a aurora. Para livrar-se do mal, é preciso que alguém sinta por elas um amor que seja totalmente puro e verdadeiro. No primeiro ato, nos jardins de um castelo, o príncipe Siegfried e seus amigos e amigas se preparam para o baile que acontecerá no dia seguinte. Como presente de aniversário, ele ganha um arco de caça e a permissão de sua mãe para escolher uma entre as jovens do reino para se casar. Pensativo, ele decide sair em direção ao lago tão logo anoitece. Lá encontra Odette e todas as outras meninas e conhece a sua terrível história. Apaixonado, jura amor eterno à Odette antes de amanhecer, despedindo-se dela quando a jovem volta a ser uma ave. No terceiro ato, acontece o baile de aniversário de Siegfried, de que participam várias comitivas vindas de lugares diferentes do mundo. Subitamente, Rothbart tem a sua presença anunciada. Odile, sua filha, vem com ele vestida de cisne negro. Cego de paixão, o príncipe jura a Odile amor eterno, sem perceber que Odette, novamente na forma humana, assiste à traição de Siegfried pela janela. Vitorioso, Rothbart vai embora, deixando desolado Siegfried que, então, percebe o mal que fez. Na floresta, às margens do lago, todos os cisnes consolam Odette que vê fracassada a sua única possibilidade de redenção, perdido o seu amor. As súplicas de perdão feitas pelo arrependido Siegfried não são suficientes e irritam Rothbart. No final escolhido por Pankova, que é diferente dos finais mais conhecidos para a peça, o príncipe e o bruxo duelam e Siegfried sai vitorioso, mas é tarde demais, pois Odette, nesse momento, já tirou a sua própria vida.* 

Esta montagem de “O Lago dos Cisnes” paga, com a perda do ritmo, o preço pela beleza visual. Dois longos intervalos acontecem para a mudança de cenário, o que prejudica a fruição. Feijoo (Odette/Odile) e Luiz (Siegfried) têm boas performances, mas falta-lhes a pujança que o romantismo exige. Porque exagerado, Carlos Cabral (Rothbart) comprime a grandiosidade de seu personagem, deixando-o menor que o príncipe apesar do figurino (a cena do Prólogo é terrível!) que o primeiro veste. São bastante positivos o segundo e o quarto ato quando vemos as mulheres próximas do lago, porém, sem acompanhar o programa, fica difícil compreender a transformação dos cisnes em humanos e das mulheres em aves com a chegada da noite e o início do dia. O fim escolhido por Pankova, com um estranho desaparecimento do bruxo ferido, perde também a oportunidade de esclarecer o destino dos outros cisnes (Com a morte de Rothbart, o feitiço foi desfeito ou passou a durar para sempre?). O ponto alto está no terceiro ato pelo colorido da articulação nobilíssima entre o cenário, cujo efeito em 3D é visível (destaque para o lago prateado ao fundo), e pelas execuções coreográficas das comitivas internacionais, além do já citado figurino. Cícero Gomes (o Bobo) ganha o público pela força, pela graça, pela vivacidade com que interpreta o seu personagem, em menor participação, mas com grande e vencido desafio. 

Com belíssimo caimento, capacidade de reflexão da luz, profundidade e ponto de fuga, o cenário e o figurino (ambos parte do acervo próprio do Theatro Municipal) emolduram com elegância a narrativa de Tchaikovsky. Com um grupo grande de bailarinos, a história é contada de forma positiva em termos de técnica e de estética de forma exuberante, mesmo com os problemas normais em sessão de estreia. Com quase 150 anos, “O Lago dos Cisnes” continua vencendo o melodrama e mantendo o romantismo do século XIX com coragem, força, orgulho e maestria. 

* No final original, Siegfried fere uma das asas do bruxo, destruindo o seu poder e libertando do feitiço todos os cisnes para sempre. O príncipe e Odette se casam. Em outro final bem conhecido, o príncipe resolve morrer ao lado de Odette, o que destrói o poder de Rothbart. Em outro ainda, a traição de Siegfried faz com que Odette nunca mais possa retornar à forma humana, terminando a encenação com o príncipe desolado e solitário em cena. 
** Clique aqui para assistir aos bastidores da montagem

*

Ficha técnica:
"O Lago dos Cisnes" com base na criação original de Marius Petipa, Lev Ivanov e Vladimir Burmeister
Ballet e Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal do Rio de Janeiro
Música: Piotr I. Tchaikovsky
Coreografia: Yelena Pankova
Coreógrafa Assistente: Gisèle Santoro
Remontagem: Eric Frederic, Celeste Lima, Cecília Kerche e Sérgio Lobato
Direção Artística do BTM: Hélio Bejani
Regência: Silvio Viegas
Iluminação: Felicio Mafra

Elenco (na estreia):
Odette/Odile: Lorena Feijoo
Von Rothbart: Carlos Cabral
Siegfried: Victor Luiz
Rainha Mãe: Marjorie Morrison
Bobo: Cícero Gomes

e
Adriana Duarte
Aiala Oliveira
Alessandra do Vale
Aloani Bastos
Amanda dos Prazeres
Anderson Dionísio
Andressa Viana
Anna Carolina Gouveia
Anna Luiza Romão
Beatriz de Paula
Beatriz Lima
Bruno Fernandes
Carla Carolina
Carolina Bastos
Carolina Neves
Cecília Nogueira
Ciro de Góis
Débora Ribeiro
Edifranc Alves
Elida Brum
Enéas Brandão
Flávia Carlos
Isabel Torres
Ivan Franco
Joseny Coutinho
Juliana Valadão
Karen Mesquita
Karin Shotterbeck
Larissa Lins
Lúcio Kalbusch
Luiz Carlos Cavalcanti
Marcella Gil
Marcia Antunes
Márcia Faggioni
Margheritta Tostes
Mateus Dutra
Melissa Oliveira
Moacir Emanuel
Mônica Barbosa
Murilo Gabriel
Nina Damasco
Paula Mendes
Paula Passos
Paulo Arguelles
Paulo Muniz
Paulo Ricardo
Priscila Albuquerque
Priscila Mota
Rachel Ribeiro
Renata Gouvea
Renata Soares
Rita Martins
Rodrigo Negri
Ronaldo Martins
Rosinha Pulitini
Sabrina Germann
Samantha Monteiro
Santiago Junior
Saulo Finelon
Sergio Landim
Sergio Martins
Tendo Pereira
Thayara Teixeira
Vanessa Pedro
Viviane Barreto
Wellington Gomes

Substitutos nos Papéis Principais:
Claudia Mota
Denis Vieira
Filipe Moreira
Marcia Jaqueline

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