quinta-feira, 16 de maio de 2013

Silêncios claros (RJ)

Cenário de Jorge Roriz e iluminação de Vilmar Olos
são destaques na peça a partir de contos de
Clarice Lispector
Foto: divulgação

Corajosa proposta: desafios transpostos: ótimo espetáculo

A partir de quatro contos de Clarice Lispector (1920-1977), Ester Jablonski surge com “Silêncios Claros”, produção que levou dez anos para ser maturada. Dirigida por Fernando Philbert, a peça, em cartaz no Parque das Ruínas e no Teatro Serrador, reúne quatro textos da escritora ucraniana naturalizada brasileira conhecida por seus personagens intimistas e seu fluxo livre de consciência. Talvez seja por isso, por essa característica tão forte dos textos de Lispector, que o monólogo não seja excelente, apesar de ótimo. As personagens ou a personagem interpretada(s) por Jablonski é sempre duas, no mínimo, ao mesmo tempo: quem faz e quem narra. E as forças de ambas não são as mesmas. Os grandes destaques da produção são a concepção de cenário de Jorge Roriz e de iluminação de Vilmar Olos, que, com inteligência e força, concretizam no palco alguns conceitos essenciais para a fruição da obra cênica. 

A dramaturgia parte dos textos “A fuga”, “O grande passeio”, “Uma tarde plena” e “Uma galinha”. Todos eles, de uma forma geral, refletem a solidão, ou o ponto de vista solitário de alguém em relação ao mundo. O externo das personagens surge filtrado pelo interior sensível de indivíduos que não têm poder nem força para modificar a sua realidade, assistindo aos acontecimentos. Não se tratam de vítimas, nem de cúmplices, mas de um tipo de plateia cuja opinião não interessa a ninguém. O espetáculo que elas vêem, assim, são os fenômenos que acontecem dia a dia diante dos seus olhos: a galinha no canto da casa, a cachoeira, o Maranhão, o bicho que poderia ser um rato,... Nesse sentido, a gloriosa contribuição de Lispector para a literatura é a oferta de uma força que protege suas personagens diante das agruras e das felicidades do mundo, de forma que elas estão, mais do que são. É essa força que a escritora tem a dar através de seus livros.

Na concepção de dramaturgia, direção e de interpretação da peça teatral, Jablonski precisa narrar e interpretar, isto é, sentir e pensar, ou viver e informar o que está vivendo quase ao mesmo tempo. Sem dúvida, eis aí um desafio bastante grande uma vez que expressar a solidão, contando sobre ela para alguém, é uma dialética complexa que, não com facilidade, a arte consegue dar conta. O cenário de Roriz e a iluminação de Olos contextualizam a personagem em um quadro que favorece a transposição desse obstáculo positivamente. Cadeiras suspensas (lugares, posições, cargos, situações discursivas: mãe, filha, parente, desconhecida, companheira de viagem, mulher...) estão unidas por fios em uma rede que expressa relações. O desenho de luz pinta o palco com linhas, valorizando a atriz no momento em que ela necessita ser vista pelo público, mas sempre destacando a forma solitária com que ela dá a ver a sua personagem também solitária. Por fim, a trilha sonora de Marcelo Alonso Neves marca a passagem do tempo e o ritmo da narrativa: tratando a história como se ela fosse algo a ser confessada para si mesmo. Pela forma como todos os elementos estão envolvidos, o resultado é positivo, porque a proposta foi atingida apesar de sua corajosa pretensão. 

O sucesso de Clarice Lispector, assim como o de seu discípulo Caio Fernando Abreu, se dá em função da literatura ser um tipo de arte que se frui sozinho. Com o teatro, o que acontece não é o mesmo. Construir com sucesso uma estrutura propícia, considerando as necessidades de cada dispositivo para narrar (livro e palco), é um problema anterior à narrativa. Jablonksi e sua equipe estão de parabéns. 

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Ficha Técnica:
Textos: Clarice Lispector
Direção: Fernando Philbert
Elenco: Ester Jablonski
Iluminação: Vilmar Olos
Musica Original: Marcelo Alonso Neves
Operador de Som e Luz: Felipe Antello
Figurino: Kiara Bianca
Cenário: Jorge Roriz
Fotos: Adélia Jeveaux
Programação Gráfica: Cláucio Salles
Direção de Produção: Daniela Paita
Produção: Jablonsky Produções
Assessoria de Imprensa: lu nabuco assessoria em comunicação

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