sábado, 1 de junho de 2013

5 garrafas de cana e 1 caju maduro (RJ)

Nova peça de Leon Góes atualiza gênero e diverte
Foto: divulgação

Prato cheio de coisa boa!

“5 garrafas de cana e 1 caju maduro” é uma excelente surpresa no teatro brasileiro. Sempre que se pensa em Commedia dell`Arte, se recorre a Carlo Goldoni (1707-1793) e a todos os personagens referenciais desse gênero popular que veio da Idade Média, do carnaval e das alegorias cênicas. As figuras, que são rígidas, se encontram em histórias, sendo as primeiras mais fortes que as segundas. Como os personagens já são conhecidos e a história não, dá-se o equilíbrio. No caso dessa peça de Leon Góes, o desafio é grande. As figuras são igualmente enrijecidas e a história é um mero pretexto para o encontro delas. O caso em questão é que o público aqui não conhece esses personagens, ou seja, o risco de desequilíbrio é imenso. Porque ultrapassado, os aplausos vêm em pé na temporada cumprida no Parque das Ruínas, em Santa Teresa, Rio de Janeiro, de forma que a conclusão é excelente.

Um grupo de pessoas se encontram em um bar, um cabaret antigo, cheio de velhas histórias e que ainda guarda um resquício do charme que teve outrora. A história, que se passa no nordeste brasileiro, mas que bem poderia acontecer no pampa gaúcho, em um “pé sujo” carioca ou uma venda no pantanal, está longe de ter um enredo forte que consiga (ou queira) prender essas figuras. Ali estão homens com suas histórias, seus medos, sua coragem e, principalmente, sua honra pronta para ser posta à prova. O diabo, o próprio deus, o sexo, a cachaça e a fome preenchem o tempo que não passa na aridez devastadora em que vivem esses personagens. Com músicas, brigas e risadas, as entradas de mulheres que vêm atrás de seus homens, do Satanás que vem atrás de quem lhe acompanhe e da morte que paira entre as paredes, tudo no espetáculo parece ter pouco valor e, justamente por isso, flui com muita leveza positivamente. O texto e a direção de Góes, auxiliado pelas canções interpretadas ao vivo pelo elenco (a direção musical é de Charles Kahn) conquistam o público que se vê preso naquele universo por vontade própria ou por boa preguiça de sair. Em questão está a pachorra, ou a lombeira, aquele cansaço que dá nas vésperas de sair para enfrentar o sol escaldante. E, isso viabilizado por excelentes trabalhos de interpretação, é terreno fertibilíssimo para o nascer de quaisquer histórias, bem contadas ou não, amarradas ou não. Interessa mesmo é estar ali (e beber cachaça).

Com figurinos de Carol Lobato e cenário de José Dias, o espetáculo flui em um ritmo excelente, sendo inteligente na medida em que não se alonga um passo além do que deve. As cenas têm bom jogo estabelecido entre os atores e bem marcados pelo desenho de luz de Paulo César de Medeiros. O excesso do colorido causa a inversão: é como se tudo fosse o amarelo queimado do sertão, o que corrobora para a narrativa cênica se estruturar e, assim, se viabilizar com tão bom resultado. 

Leon Góes, Carla Guidacci, Daniel Villas, Ricardo Damasceno, Daniel Carneiro, Sergio Kauffmann, Jade Petruccelli e Tauã de Lorena visivelmente se divertem em cena, aproximando de novo essa obra das do tempo de Goldoni. As márcaras de lá, que compunham as figuras, mas deixavam ver a crítica que os atores faziam aos personagens que eles próprios interpretavam, recebem bom uso aqui. E nos contagiam. A luta contra o tempo e contra o tédio, tão cheia de força e de graça, parte do palco e invade a plateia. “5 garrafas de cana e 1 caju maduro” é, por tudo isso, prato cheio para quem gosta de pesquisar sobre teatro, mas também pra quem gosta de esquecer-se dele e, assim, fruí-lo bem. 

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Ficha Técnica
Texto: Leon Góes
Direção: Leon Góes
Direção Musical: Charles Kahn

Elenco / Personagens:
Leon Góes / Charlatão e Baixo Meretrício 
Carla Guidacci / A Rumbeira
Daniel Villas / Chico Doido de Caicó
Ricardo Damasceno / Zé Areia
Daniel Carneiro / Moysés Sesyom
Sergio Kauffmann / Doutor Sinval
Jade Petruccelli / Emenems
Tauã de Lorena / Xibungo

Cenografia: José Dias
Iluminação: Paulo César Medeiros
Figurino: Carol Lobato
Fotos: Cézar Moraes
Programação Visual: Delly Bentes
Assistente de direção: Roberto Rossi
Assistente de direção musical: Tauã de Lorena
Direção de Produção: Caroline Alcova
Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação – João Pontes e Stella Stephany

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