quarta-feira, 19 de junho de 2013

Stand-up (RJ)

Produção lotou o Teatro Ipanema
Foto: Marcel Blanco

Um bom espetáculo

“Stand-up”, de Matheus Souza, veio antes de “As coisas que fizemos e não fizemos”, o que é bom sinal do avanço estético do segundo em relação a esse primeiro. Há também aqui uma boa história, os diálogos são muito inteligentes, o ponto de vista é interessante. Apesar de alguns problemas da ordem da direção e da interpretação, o espetáculo agrada, lotando a plateia do Teatro Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro. Profundidade sem pretensão é o seu maior ganho. 

Na dramaturgia de “Stand-up”, Gabriel (Matheus Souza em uma outra versão do mesmo Eduardo, protagonista de “As coisas que fizemos...”) é um jovem artista que não consegue editais para produzir seus espetáculos ou financiar seus filmes, sendo um fracasso também em seus relacionamentos amorosos. Estimulado pela mãe (Dida Camero), ele aceita reencontrar-se com uma velha amiga recém chegada de Paris. No jantar, o jovem fumante sofre um infarto em função do stress emocional. O acontecimento move o personagem a um processo de reflexão sobre a própria vida, iniciando aí uma viagem (tal qual Riobaldo, em “Grande Sertão: Veredas”) de volta para a história de seus antigos relacionamentos que nos é contada. Esse retorno, que, aliás, também acontece em “As coisas que fizemos...”, dá sustentação para novos olhares por sobre si próprio, revitalizando Heráclito na máxima “Nunca entramos duas vezes no mesmo rio”. Assim, positivamente, como também acontece no espetáculo anterior, com altas doses de humor, banalidade, jovialidade e leveza, a comédia “Stand up” fornece sugestões de reflexões sobre o comportamento humano, o mercado artístico, a influência dos avanços tecnológicos nas relações humanas, etc., casando com valores assuntos mais sérios em um formato mais acessível. 

Infelizmente, diferente da outra produção do mesmo realizador, a peça não tem boa direção. As cenas, principalmente as mais próximas do final, são longas demais, de forma que o ritmo se perde inevitavelmente. Sem justificativa, há um pseudo-intervalo no centro da narrativa que é nada mais do que cansativo. O segundo ato possui uma cena bastante mal construída em que Gabriel precisa decidir uma entre três opções. A sequência é longa, redundante, prejudicial. Felizmente, o final é positivo, havendo uma passagem capaz de vincular um pouco mais de seriedade ao trato da questão seguida de dois momentos rápidos: o ápice e o encerramento. 

Há falta de profundidade na construção de todos os personagens. Se, de um lado, a coadjuvância superficial (Mãe, Papai Noel, o Filho que há de nascer, as Namoradas, etc.) cumpre bem sua missão, os papéis protagonistas, Gabriel (Matheus Souza) e Diana (Luisa Arraes), deixam a desejar em termos de sua viabilização. Nem um nem outro manifestam curvas dramáticas, sendo lineares do início ao fim, o que empobrece a narrativa de uma honra e quarenta minutos infelizmente. 

O pastiche que norteia a concepção de cenário e de figurinos é coerente com a dramaturgia tanto literária (os diálogos) quanto cênica. A história acontece dentro de um teatro fechado, onde Gabriel e Diana fizeram a sua primeira peça. Nesse sentido, os figurinos e os cenários são ficcionalmente também figurinos e cenários, o que sugere novos níveis de fruição, garantindo a inteligência apontada na abertura da análise. 

A similaridade entre os personagens Eduardo (“As coisas que fizemos...”) e Gabriel ratifica a proximidade entre o cineasta americano Woody Allen e o realizador Matheus Souza, não sendo, em uma avaliação livre de preconceitos, um aponte negativo. Destaca-se o mérito de Souza ter encontrado um bom nicho de mercado, pois “Stand-up” fala de relacionamentos sem ser um espetáculo adolescente e nem tampouco dirigir-se a casais de meia idade, cujas histórias tediosamente narram o conhecer-se, o casar-se, o separar-se e o reencontrar-se. Apesar dos senões, um bom espetáculo. 

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Ficha técnica
Texto, direção e trilha-sonora: Matheus Souza
Elenco: Alexandre Duvivier, Bia Arantes, Daniel Belmonte, Dida Camero, Hamilton Dias, Hernane Cardoso, Lua Blanco, Luisa Arraes, Matheus Souza, Marianna Pastori, Pablo Leal, Rafael Oliveira e Victor Gorgulho
Produção: Erika Mader
Cenografia: Ana Bial e Carolina Camargo
Figurino: Guta Muniz e Mariah Leão
Iluminação: Rodrigo Belay
Ilustração e identidade visual: Tiago Elcerdo
Direção de movimento: Roberta Repetto
Assistência de produção e assessoria de imprensa: Marcela Nunes
Assistência de direção: Pedro Cadore
Operação de luz: Mônica Diniz
Operação de som: Telma Lemos
Operação de vídeo: Victor Damasceno
Contrarregra: Luis Caieiro
Camareira: Luciana Sales
Realização: Auch Produções

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