segunda-feira, 24 de março de 2014

Homens de Solas de Vento (SP)

Ricardo Rodrigues e Bruno Rudolf na abertura nacional do
17o Palco Giratório em Porto Velho/RO
Foto: divulgação

Um grande espetáculo no maior evento de difusão das artes cênicas do país

“Homens de Solas de Vento” é o espetáculo convidado a abrir a 17a edição do Palco Giratório do SESC, o maior evento de difusão das artes cênicas do país. Seguindo na trilha de “A memória roubada”, "Os perdidos" e “A volta ao mundo em 80 dias”, a atual produção da Cia. Homens de Solas de Vento envolve técnicas circenses na viabilização de sua narrativa, trazendo do espectador não apenas o seu intelecto e a sua emoção, mas requisitando a sua consciência enquanto homem físico. O circuito nacional do Sesc teve abertura solene em Porto Velho, no estado de Rondônia. A escolha por essa cidade é, também, simbólica: a programação levará 768 apresentações artísticas e mais de 1.200 horas de oficinas a 126 cidades diferentes (26 estados) entre março e novembro de 2014. Neste ano, a bailarina e pesquisadora Angel Vianna (85 anos) será homenageada. Márcia Costa Rodrigues, gerente de cultura do Sesc, reforça que a curadoria não foi de espetáculos, mas de grupos, o que dá importância não apenas às qualidades estéticas do espetáculo em si, mas à pesquisa no campo das artes dos grupos participantes. A Cia. Solas de Vento, de São Paulo, foi um dos 19 grupos escolhidos para “girar” das cidades mais distantes até as grandes capitais. No espetáculo “Homens de Solas de Vento”, não há falas, de forma que toda a dramaturgia é voltada para expressão física. Em um país de tão grandes proporções e de uma variada cartela de identidades, certamente será bonito admirar como os públicos diversos receberão esse lindo espetáculo teatral.

Dois homens ficam presos em uma alfândega, sem conseguir viajar. Vê-se suas malas e sua empolgação para partir, vê-se os passaportes constantemente mostrados e sua frustração a ouvir o impedimento, vê-se a espera. Não sabemos quem são, para onde vão, de onde vêm, seus nomes, seus estados civis, a época em que vivem (embora possamos acreditar que não é hoje pela ausência de ferramentas tecnológicas, como telefones celulares, etc). Ou seja, os personagens se expressam através do mínimo de informações – não são mulheres, não são velhos nem crianças, não são nem paupérrimos nem milionários – deixando o resto por conta do preenchimento do público. Quanto ao lugar e ao tempo, também acontece o mesmo – entraram, mas não podem sair. O tempo passa, pois as ações não se repetem, mas não se sabe ao certo o quanto passa. Ou seja, em termos de narrativa, os "buracos" da história têm mesmo tamanho de seu preenchimento, de forma que peça requisita um público que não é apenas audiência, mas criador. 

Dirigido por Rodrigo Mateus e interpretado por Bruno Rudolf e por Ricardo Rodrigues, a peça se narra principalmente pelo preciosismo das possibilidades corporais no ato da expressão. Os atores caem, pulam, se penduram, batem e se batem a partir de detalhes minuciosamente planejados que encantam o olhar do espectador que, antes de tudo, se vê no lugar dos intérpretes, esses em excelentes formas físicas. Em outras palavras, antes de ser um olhar de espectador para personagem, é um olhar de homem para homem, pois as acrobacias cheias de lirismo a que se assiste fazem oposição, mas partem do corpo humano, tão humano quanto o do público. Terminada a peça, as pessoas da plateia poderão sair do teatro apesar de terem estado em repouso durante a audiência. Por outro lado, apagadas as luzes do palco, os personagens permanecerão ali à espera, apesar de tantos movimentos em contrário. Essa oposição é um dos grandes méritos estéticos dessa obra.

Com belíssimo trabalho de orientaçãoo circense e de coreografia (Erica Stoppel e Adriana Grecchi), “Homens de Solas de Vento” tem desenho de luz de Douglas Valiense e de Maria Druck e trilha sonora de Marcelo Lujan. O todo viabiliza amarrada concepção cênica e narrativa que acaba por prender a atenção mesmo quando as informações estão apenas sendo ratificadas. Para o final, está reservado um desfecho que coroa o tema central da produção: somos homens e vivemos, mas somos homens melhores quando convivemos.

Além da Cia. Solas de Vento, o grupo permambucano Magiluth, o gaúcho Gente Falante e o tocantinense Lamira Artes Cênicas integraram a semana de abertura nacional do 17o Palco Giratório do Sesc. Não há dúvidas de que há de ser um ano de excelente programação.


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Ficha técnica

Argumento/concepção: Bruno Rudolf e Ricardo Rodrigues
Direção: Rodrigo Matheus
Elenco: Bruno Rudolf e Ricardo Rodrigues
Trilha sonora: Marcelo Lujan
Iluminação: Douglas Valiense e Maria Druck
Orientação de Arte: Luciana Bueno.
Orientação Circense: Erica Stoppel
Orientação Coreográfica: Adriana Grecchi
Orientação de Montagem em Altura: Alex Marinho.
Operação de luz: Marcel Gilber ou Roseli Martinelli ou Amanda Felisbino
Operação de Som: Bruno Cavalcanti ou Luana Alves ou Bruno Bachy
Fotografia: Mariana Chama
Programação Visual: Sato – Casadalapa
Produção: Cia. Solas de Vento.

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