sábado, 17 de maio de 2014

Pesadelo (RJ)

Maria Assunção em cena
Foto: divulgação

Ótimo espetáculo da Cia. Sala Escura

“Pesadelo” é o melhor espetáculo assinado pela Cia. Sala Escura de Teatro e por Iuri Kruschewsky. Os diálogos são tão ágeis quanto as cenas e sua evolução. As músicas entram como um elemento que contribui e não apenas redunda, a escassez dos objetos é declaradamente um efeito simbólico, as interpretações são bastante pontuais e positivas no conjunto e nas partes. Em cartaz no Centro Cultural Municipal Sergio Porto, no Humaitá, a peça encerra a Trilogia dos Sonhos, também composta pelos espetáculos “É culpa da vida que sonhei ou dos sonhos que vivi” e “Memória inventada no sonho de alguém”.

A história começa quando um homem (Bruno Quaresma) se vê preso dentro do estranho apartamento de Marta (Maria Assunção), cuja cabeça é a única parte do corpo que vemos. A princípio, eles foram colegas de classe quando ainda crianças, mas ele sempre a ignorou. Um espécie de jogo bergmaniano começa entre os dois: por mais que ele tente, parece não haver porta de saída dessa casa onde tudo é escuro. Aos poucos, outros personagens vão ficando mais claros ao espectador que conhece a história a partir do protagonista. Aparecem uma prima e a mãe que faleceram na infância, o cachorro perdido há muitos anos e, por fim, a ex-namorada ainda viva. A agilidade dos diálogos e das cenas constróem a sensação de flashes de memória através dos quais pode-se descobrir os antecedentes dramáticos da situação inicial de “Pesadelo”. Em foco, nem o Homem, nem seus conhecidos, mas momentos relevantes, reais sou não, na relação entre eles. De uma forma sutil e inteligente, a narrativa se descoloca de Marta para os outros personagens para, enfim, chegar ao protagonista. O final é excelente tanto do ponto de vista da dramaturgia literária quanto da cênica.

A qualidade do conjunto de interpretações revela os valores da direção por construir uma estrutura que é firme no delineamento de cada personagem, mas também no todo das coreografias, das trocas de cenas, da viabilização dos quadros. No entanto, o destaque para Bruno Quaresma e para Maria Assunção é inevitável. Marta é apresentada com excelente dicção, ritmo e pausas que são ainda mais elogiáveis considerando o fato de que só vemos a intérprete do pescoço para cima. Por outro lado, o protagonista surge com vibrante agilidade, bela e afinada voz nos números musicais, intenções claras e riqueza de detalhes tanto nas cenas solo quanto nas contracenas.

O espetáculo se apresenta a partir de um quadro estético econômico. São poucos os objetos de cena e isso garante as entradas e as saídas rápidas e a boa evolução da narrativa. A preferência natural pelo preto com poucos detalhes em vermelho, no cenário de Flávio Graff e nos figurinos de Elisa Faulhaber, informa ao espectador que seu lugar é nos diálogos e não nos elementos plásticos. O desenho de luz de João Gioia e de Ana Luzia de Simoni garante fluidez, versatilidade e beleza, ilustrando bem os flashes de memória de que fala o texto na ordem do conteúdo. A trilha sonora interpretada ao vivo pelos músicos Daniel Pimenta, Filipe Oliveira, João Medeiros e Pedro Nêgo tem  números rápidos que comentam as cenas, sugerem novos pontos de vista, mas, como tudo, se esvaem naturalmente, ratificando as marcas de coesão e de coerência da peça como um todo bem articulado.

Iuri Kruschewsky se estabelece como autor e como encenador com “Pesadelo” de forma vigorosa e cheia de méritos. A "Trilogia dos Sonhos" termina nessa produção, tratando da consciência de forma mais efetiva do que os demais espetáculos falaram do devaneio, das memórias e do sonho propriamente dito. Vale ver como os pequenos detalhes do texto dramatúrgico e cênico estão imanentes e podem vir à luz se o espectador quiser assim como os mais essenciais. Aplausos.

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Ficha técnica:
Texto e direção: Iuri Kruschewsky
Elenco: Ana Beatriz Macedo, Ariella Braz, Breno Augusto Guimarães, Bruno Quaresma, Maria Assunção, Marianna Pastori, Nayana Carvalho, Patrícia Elizardo e Rodrigo Turazzi
Músicos em Cena: Daniel Pimenta, Filipe Oliveira, João Medeiros e Pedro Nêgo
Direção de Produção: João Braune – Fomenta Produções
Direção Musical: João Medeiros e Pedro Nêgo
Direção de Movimento: Lavínia Bizzotto
Cenário: Flávio Graff
Figurino: Elisa Faulhaber
Iluminação: João Gioia e Ana Luzia de Simoni
Assistente de Cenário: Bruno Lopes
Assistente de Figurino: Anouk Zee Pelino e Mario Surcan
Produção Executiva: Carolina Goulart e Matheus Marques – Fomenta Produções
Efeitos Especiais: Nurder Efeitos EspeciaisCenotécnicos: Humberto Silva e Humberto Oliveira Jr
Programação Visual: Agência EGX
Assessoria de Imprensa: André Gomes - Smart Mídia Comunicação e Assessoria
Realização: Sala Escura de Teatro

2 comentários:

  1. Oi, Rodrigo! Vc viu festa de família e o funeral no espaço Sesc? Queria ler sua opinião ... Abraço

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  2. Ainda não, Monica, mas irei em breve. Vamos trocar nossas impressões? Abraços, Rodrigo

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