sábado, 6 de setembro de 2014

Dona Saudade (RJ)

Jaderson Fialho e Ivone Hoffman em cena
Foto: divulgação

Ivone Hoffman

“Dona Saudade”, dirigido por Camila Amado, é o espetáculo que tem Ivone Hoffman no papel título. O texto de Bernardo Florim conta a história de Luisa, filha de Saudade, cujo túmulo à beira-mar é procurado por seu filho adolescente Vicente. Com uma dramaturgia dividida em quadros, a peça, apesar do título, não celebra o passado, mas aponta para a necessidade de viver o presente em sua plenitude. Ao lado da interpretação de Hoffman, o cenário de Doris Rollemberg e a iluminação de Luiz Paulo Nenen são os pontos altos da produção que cumpriu temporada no Teatro 3 do CCBB.

A casa abandonada em frente ao mar se manteve esquecida há muitos anos. No passado, Saudade (Hoffman) e Luisa (Brigida Menegatti) moravam ali, a mãe assistindo à filha descobrir a juventude. Agora essas histórias motivam Carlos (Jaderson Fialho) a escrever sobre como ele próprio conheceu o amor com Luisa. Enquanto isso, do lado de fora da casa, Vicente (Fábio Cardoso) e Maria Isabel (Isabella Dionísio) procuram o lugar onde dizem ter sido enterrada a mãe dele enquanto ensaiam seus primeiros contatos sexuais. A dramaturgia de “Dona Saudade”, assim, estrutura um retrato recortado do desabrochar da vida sem fazer crítica, mas também sem se apresentar ingenuamente. O texto de Bernardo Florim tem o mérito de bem narrar, mas também de deixar que o público faça a sua leitura da narrativa.

Um dos aspectos mais positivos, a direção de Camila Amado, assistida por Anderson Aragón, conduziu com excelência o trabalho da personagem título. As voltas ao passado (Luisa) e os diálogos com o presente (Carlos) não manifestam alguma diferença na forma como Saudade se expressa. Ela parece sempre ter sido a mesma pessoa, alguém que foi também jovem, que sofre pela perda da filha, que tem recordações tristes e que se sente sozinha, mas cuja alegria parece não desaparecer. Dessa forma, Saudade funciona como uma base de abordagem por sobre os outros personagens, todos eles em bons trabalhos de interpretação. O ritmo, que permanece inalterado, posiciona um certo tipo de moldura que oferece a obra sem fechá-la. O resultado é positivo.

O cenário de Doris Rolemberg, dispondo o público em meia arena, coloca a narrativa em um lugar oxigenado, amplo, livre que contribui muito para a história que se passa em uma casa em frente ao mar. Não vemos a contrução, mas os blocos de diferentes tamanhos justapostos apontam simbolicamente para ela, para suas madeiras, para o seu abandono. Os vídeos (Gultavo Gelmini) são projetados em quadrados brancos próximos uns dos outros, mas não situados em mesmo nível, de forma que o todo da tela também não é plano. A iluminação de Luiz Paulo Nenén banha os personagens e, ao lado do cenário e dos vídeos, mas também junto do figurino em cortes simples e sem estampas de Luciana Cardoso e da trilha sonora simbolista de Marcelo Alonso Neves, parecem sustentar as cenas em planos acima do chão.

“Dona Saudade” faz da lembrança algo mais do que positivo, mas algo vital, que é parte da existência humana e que é ponto crucial de sua identidade. Com estrutura nada pretensiosa e cheia de méritos, a peça merece novas temporadas e aplausos. 

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Ficha técnica:
Texto de Bernardo Florim
Com Ivone Hoffman, Jaderson Fialho, Brigida Menegatti, Fábio Cardoso e Isabella Dionísio
Direção: Camila Amado

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