terça-feira, 28 de outubro de 2014

Entredentes (RJ)


Ney Latorraca, Maria de Lima e Edi Botelho em cena
Foto: divulgação

Frustrante

“Entredentes” é constrangedoramente ruim, porque nem define qual é a relação com o público, nem se utiliza da indefinição para discutir um conceito de arte que possa promover uma reflexão social. Escrito e dirigido por Gerald Thomas, o único bom motivo para assistir ao espetáculo é a oportunidade de rever Ney Latorraca em cena. A peça está em cartaz no Teatro Sesc Ginástico no centro do Rio de Janeiro.

Na primeira cena, dois astronautas se encontram em algum lugar fora da Terra. Em seguida, eles aparecem, segundo o release, no Muro das Lamentações em Jerusalém. Os personagens Didi (Edi Botelho) é muçulmano e Ney (Ney Latorraca, para quem a peça foi escrita) é um judeu com ares de mediunidade umbandista (vulgo “macumbeiro”). A piada, no entanto, para nessa situação pseudo-dramatúrgica, pouco avançando nas performances dos intérpretes e na cenografia, em que se vislumbra a possibilidade de uma imensa vagina pichada no Muro. Ao longo de noventa minutos, talvez o único momento relevante seja uma crítica direta, franca e explosiva ao Brasil, que se torna engraçada porque é feita com o sotaque português de Maria (a atriz portuguesa Maria de Lima), um terceiro personagem sem contornos minimamente definidos.

O teatro pós-dramático infelizmente não pode ser requisitado como base de análise para “Entredentes”. Nas produções concebidas sob esse conceito, os diversos signos justapostos em cena têm relações sugeridas e sua estruturação revela uma reflexão: o espectador há que ser ativo por sobre a peça da qual participa. Em “Entredentes”, a crítica de um estado social da guerra (religiosa, política ou moral) perde força diante da piada comercial, que, por sua vez, se mostra gratuita e sem identificação. As imagens são esteticamente pobres de forma que a falta de um investimento nesse sentido também deixa de contribuir para o referencial artístico do pós-dramático (ver a teoria de Hans-Thiesen Lehmann). O fato de não haver limites claros entre os personagens e os atores que os interpretam não é suficiente para estabelecer uma relação de investigação artística entre os realizadores e o público.

A proposta anunciada de querer dizer muito serve aqui apenas para não dizer algo realmente sólido infelizmente. Apesar do nobre currículo dos autores de “Entredentes”, a opção não vale a pena. Frustrante.

*

Ficha Técnica:
Autor e Diretor: Gerald Thomas
Elenco: Ney Latorraca, Edi Botelho e Maria de Lima
Iluminação: Gerald Thomas
Designer de Luz: Wagner Pinto
Cenografia: Lu Bueno e Gerald Thomas
Figurino e Programação Visual: Lu Bueno
Direção de Movimento: Daniella Visco
Trilha Sonora: Gerald Thomas (“Chão de Estrelas” de Orestes Barbosa e Silvio Caldas, sobre música de Philip Glass.)
Assistente de Direção/Diretor de Cena: Gabriel Barone
Designer de Som: Tocko Michelazzo
Técnico Operador de Som: Antonio Neto
Técnico Operador de Luz: Wagner Pinto
Assistente de Iluminação: Tulio Pezzoni
Montagem da Luz: Equipe Armazém da Luz - SP
Microfonista: Adriana Lima
Contrarregra: Wanderley D. Lascko e Robson Patrício
Camareira: Cacinha Tiengo
Cenotécnico: Gereba e equipe
Fotógrafo: Guga Melgar
Design Gráfico RJ: Espaço Donas Marcianas
Ilustração: Gerald Thomas
Assistentes de Produção: Claudio Calixto e Maria Inês Vale
Assessoria de Imprensa: Ney Motta
Direção de Produção: Willian Taranto
Produção: Taranto Produções

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