segunda-feira, 4 de maio de 2015

Infância, tiros e plumas (RJ)

Foto: divulgação

Junior Dantas, Juliane Bodini e Debora Lamm


O esforço de Inez Viana para salvar texto de Jô Bilac

            Com algum sucesso, em “Infância, tiros e plumas”, se vê o esforço enorme de Inez Viana em tornar o texto de Jô Bilac interessante. Os trabalhos de interpretação de Carolina Pismel e de Debora Lamm ajudam, o cenário de Mina Quental, o figurino de Flavio Souza e a iluminação de Renato Machado e de Ana Luzia de Simoni também, mas o espetáculo permanece acanhado. Em cartaz no Teatro SESC Ginástico, no centro do Rio, a quarta produção da Cia. OmondÉ não diz a que veio.

Inúmeras vezes elogiado e merecidamente vencedor de diversos prêmios, Jô Bilac enfim assina um texto aquém das expectativas. Na trama, um grupo de passageiros embarca na primeira classe de um voo para Disneylândia: o médico Henrique (Leonardo Bricio), sua esposa Marím (Debora Lamm) e seu filho Junior (Luis Antonio Fortes); Suzaninha, a candidata à Miss Universo Mirim (Carolina Pismel), e seu segurança Argos (Iano Salomão); o pequeno Juanito (Jefferson Schroeder); e os comissários de bordo Sângela (Juliane Bodini), Pitil (Zé Wendell) e Cheval (Junior Dantas), a primeira é amante de Henrique e o segundo - de alguma forma - é responsável por Juanito. É visível que, nesse texto tragicômico, há uma crítica à sociedade de consumo. Os diálogos cheios de referências e os personagens têm forte inspiração no universo pulp fiction. Depois de cinquenta minutos de apresentação, porém, muito pouco será encontrado em termos de narrativa que justifique o todo dessa dramaturgia. Tudo de “Infância, tiros e plumas” já foi visto em “Mamutes”, primeiro texto escrito por Jô Bilac e segundo espetáculo da Cia OmondÉ. Frustrante!

Sobre o espetáculo, a direção faz a narrativa começar perigosamente no topo, mas, de forma exuberante, consegue crescer ainda mais, marcando uma sutil curva ascendente. O feito consegue espantar a monotonia dos personagens, esses construídos pelo texto a partir de seus universos particulares sem quase qualquer relação uns com os outros a não ser o fato de estarem unidos no mesmo ambiente. Cheval (Junior Dantas) e Sângela (Juliane Bodini) têm relances de complexidade, mas pouco espaço para exibi-los em duelo tão linear. Por outro lado, Suzaninha (Carolina Pismel) não tem complexidade alguma, mas sua intérprete, em trabalho brilhante, faz sua personagem se destacar. O melhor trabalho do grupo é o de Debora Lamm. A atriz consegue conferir ironia e autopiedade a sua Marím através de uma performance em que as entonações não param de se modificar, a risada permaneça repleta de significado, as movimentações e as respostas sejam tão interessantes quanto às imagens que seus diálogos viabilizam. No todo, Inez Viana, assistida por Marta Paret, tem o mérito de apresentar um ótimo trabalho de direção de atores. Não há maus trabalhos de interpretação aqui e isso é um mérito.

Os aspectos visuais de “Infância, tiros e plumas” são pontos altos da produção. O figurino de Flavio Souza dá a ver o universo de cada personagem contribuindo para o tom estático de cada um deles, mas também para a referência tragicômica. A iluminação de Renato Machado e de Ana Luzia de Simoni contrapõe o infinito do céu em que esse avião desliza com as luzes internas da aeronave, essas impessoais e mornas. O cenário de Mina Quental – Atelier na Glória é excelente em todos os seus aspectos. O chão inclinado, com a parte da frente mais embaixo que a do fundo, é metáfora para o desacerto do ambiente que não é em terra firme, mas seu melhor aspecto são os acentos que surgem do chão. Nas laterais, as placas remetem aos painéis de letras móveis de aeroportos, mas também podem representar os micro espaços muito aproveitados dos aviões. A produção tem direção musical pontual assinada por Marcelo Alonso Neves.

“Infância, tiros e plumas” é o vigésimo primeiro texto encenado de Jô Bilac. Ainda que não faça jus a sua carreira, a produção é uma ótima oportunidade para o público carioca reconhecer o talento de Inez Viana como encenadora e da Cia OmondÉ como grupo artístico que merece toda a atenção.

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FICHA TÉCNICA
Texto: Jô Bilac
Direção: Inez Viana
Direção de Produção: Cláudia Marques - Fábrica de Eventos
Elenco/Cia OmondÉ: Carolina Pismel/Lú Camy, Débora Lamm, Iano Salomão, Jefferson Schroeder, Juliane Bodini, Júnior Dantas, Leonardo Bricio, Luís Antônio Fortes e Zé Wendell
Cenário: Mina Quental
Figurino: Flavio Souza
Iluminação: Renato Machado
Direção Musical: Marcelo Alonso Neves
Direção de Movimento: Dani Amorim
Assistente de Direção: Marta Paret
Produtores Executivos: Rafael Faustini e Jéssica Santiago
Assistente de Produção: Maíra Zago
Programação Visual: Felipe Braga
Assessoria de Imprensa: Ney Motta

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Outras peças escritas por Jô Bilac (em ordem alfabética):


2 p/ viagem (com Miguel Thiré e Mateus Solano)

Alguém acaba de morrer lá fora (leia a crítica aqui)

Beije minha lápide (leia a crítica aqui)

Bette Davis e a máquina de Coca-cola (com Renata Mizhari) (leia a crítica aqui)

Bruxarias urbanas

 Cachorro!

 Caixa de areia (leia a crítica aqui)

 Conselho de classe (leia a crítica aqui)

 Cucaracha (leia a crítica aqui)

 Desesperadas

 Fluxorama (leia a crítica aqui)

 Limpe todo o sangue antes que manche o carpete (leia a crítica aqui)

 Mamutes

 Matador de santas (leia a crítica aqui)

 O gato branco

 Petit monstre

 Popcorn - Qualquer semelhança não é mera coincidência (leia a crítica aqui)

 Rebú (leia a crítica aqui)

 Savana glacial (leia a crítica aqui)

 Serpente verde sabor maçã (parceria com Larissa Câmara)

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