quarta-feira, 22 de julho de 2015

Palavra de Mulher (RJ)

Foto: divulgação

Cartaz de divulgação

Problemas em espetáculo sobre as mulheres

O espetáculo “Palavra de Mulher” apresenta intenções nobres, mas diversos problemas de ordem estética. Escrito e dirigido por Oscar Calixto, a obra tem o mérito de evocar diversas questões pertinentes às lutas das mulheres em favor de relações sociais mais igualitárias, mas cenicamente sobrevive com dificuldade à justaposição de cenas cômicas e dramáticas, aos muitos problemas nas estruturas de cada quadro, às interpretações sem medida e à concepção cambaleante dos figurinos de Wanderley Gomes e de Fabiana Ouverney. Idealizado e interpretado por Shirley Cruz, no elenco, além, dela, também estão Dani Brescianini, Julli Roldão, Luciana Pacheco e Giselle Motta. Da Companhia Contemporânea Mulher de Palavra, a peça está em cartaz no Teatro Cândido Mendes, em Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro.

Estruturada em quadros, a dramaturgia de Oscar Calixto oferece um panorama parcial da situação da mulher nos últimos trezentos anos. No primeiro diálogo, uma dama (Julli Roldão) e uma criada (Luciana Pacheco), no século XVII, conversam sobre as ausências do marido da primeira enquanto a segunda fala sobre o que aprendeu sobre o futuro da mulher. A ação pula para a primeira metade do século XX quando uma esposa (Dani Brescianni) exige do marido (Shirley Cruz) maior liberdade de ação e de pensamento motivada pelos livros feministas que anda lendo. Na última cena, uma entrevistadora (Cruz) recebe Eva (Brescianini), a diretora de uma grande empresa que é mãe de três filhos. No centro da história, além de outras cenas menores, quadros coreografados por Adriana Bandeira marcam bem a articulação de cenas mal escritas em seu universo particular.

Sem optar por uma matriz estética que dê corpo e organize a diversidade do texto, Oscar Calixto oferece quase nada de muito e bastante de pouco. Falta na dramaturgia de todas as cenas, maior reflexão sobre questões relevantes que estejam por trás das situações divididas pelos personagens. O que une os quadros no todo da peça parece ser simplesmente a luta da mulher, mas, ao mesmo tempo em que o texto reclama para si atenção a sua complexidade, oferece em contrapartida um ponto de vista bastante superficial, com maridos traindo ou batendo em mulheres, homens as abandonando ou simplesmente sendo mais irresponsáveis que elas. Sem pontuar especificamente momento algum mas preencher espaços com frases bonitas, a dramaturgia visivelmente almeja lugar de maior relevância, mas traz diversos erros de português e não apresenta uma pesquisa realmente meritosa em termos de pesquisa no campo das artes, indo da comédia a cenas mais dramáticas como se tudo fosse a mesma coisa em termos de narrativa. Só que não é.

A direção do dramaturgo revela um trabalho igualmente sem coesão. Quadros cômicos e as cenas mais dramáticas modificam o lugar da fruição de maneira que nada se aprofunda a contento. Nos intermeios, as coreografias contemporâneas de Adriana Bandeira, que também é assistente do diretor, são talvez o único aspecto que mereça positivo destaque, mas o todo se perde mesmo assim. As interpretações são fora de medida: muitos gritos (principalmente em Shirley Cruz), expressões fortes demais e movimentos bruscos afastam a beleza de um elenco unicamente formado por belas mulheres. Dani Brescianini usa bastante bem as variações de tom e as pausas nos diálogos dramáticos, Julli Roldão apresenta bem marcas de tipos farsescos e Shirley Cruz segura com galhardia o ritmo exigido nesses contextos tão diversos, mas o apresentado no geral é pouco.

O chão coberto de folhas secas, no cenário de Karina Maldonado, e a extrema proximidade com o público do Teatro Cândido Mendes não favorecem as vivas coreografias de Adriana Bandeira, cujos detalhes mínimos acabam ficando visíveis demais negativamente. São boas também as colaborações dos vídeos de Tássia da Hora e de Ricardo Brízio, como também a trilha sonora de Luiz Méliga. Por outro lado, os figurinos de Wanderlay Gomes e de Fabiana Gomes são péssimos. Roupas íntimas só confirmam o estigma de objeto sexual sofrido pelas mulheres que a narrativa parece ter quisto discutir. As bases esvoaçantes, além de enfear as atrizes, levam a narrativa para um contexto trágico-ritualístico que também pouquíssimo se relaciona com a proposta. O pior são as crinolinas e as lingeries à mostra: mal feitas, elas só reforçam os problemas estéticos dessa produção.

Sem expressar fluência no domínio do idioma teatral, “Palavra de Mulher” apresenta-se com o mérito maior de pautar um tema tão caro à contemporaneidade. Em nossa tempo, não há mais lugar para diferenciações de gênero nem de qualquer outro tipo. É bonito identificar essa luta também na programação do teatro carioca. 

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Ficha técnica:
Idealização / Projeto / Prod. Executiva: Shirley Cruz
Texto e Direção: Oscar Calixto
Elenco: Julli Roldão, Luciana Pacheco, Dani Brescianini, Shirley Cruz e Giselle Motta
Assistente de direção / Coreografia: Adriana Bandeira
Figurinos: Wanderley Gomes
Pesquisa e Roupas Íntimas: Fabiana Ouverney
Direção de Produção: Alexandre Almassy
Produção: Thiago Coutinho
Programação Visual: Bruno Pinotti
Fotógrafa: Desiree do Valle
Cenografia: Karina Maldonado
Captação: PM Comunicações
Vídeo Finalização e Pesquisa: Tássia da Hora
Pesquisa Imagem: Fabiano Hermógenes
Videografismo: Ricardo Brízio

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