segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Hipnose (RJ)


Foto: divulgação

Hugo Germano, Ivson Rainero e (à frente) Carine Klimeck


Carine Klimeck e Hugo Germano em ótimas interpretações


A peça “Hipnose – uma tragicomédia carioca” encerrou, no último domingo, 16 de agosto, uma curtíssima temporada no Teatro Glauce Rocha, no centro do Rio. Ela participou do projeto “Grande Minorias”, idealizado pela dramaturga Márcia Zanelatto, que trouxe e irá trazer até setembro diversas oportunidades de debates sobre os preconceitos sofridos por esses grupos. A programação é voltada aos públicos infantil e adulto. Encenado pela Vil Cia. de Teatro, o ótimo espetáculo tem texto de Zanelatto e direção de Renato Carreira. Além desse, destacam-se os excelentes trabalhos de interpretação de Carine Klimeck e de Hugo Germano.

Tragicomédia original de Marcia Zanelatto
Na história, dois núcleos são apresentados separadamente a princípio para, ao longo da encenação, se envolverem. De um lado, Leila (Carine Klimeck), uma dona de cada de classe média, intermedia a venda de um terreno no Morro do Vidigal para um possível comprador estrangeiro. O lucro anunciado - mas não garantido - será usado por ela na compra de um carro de que o filho Chico (Rodolfo Mesquita) precisa para ir às aulas na Barra da Tijuca - ao invés de usar o transporte público. De outro, Gago (Hugo Germano) está preso em Bangu quando toma conhecimento de um plano oficial que pode garantir sua liberdade. Para ver seu nome (ilegalmente) incluso na lista daqueles que sairão da cadeia, ele precisa “contribuir” com certa quantia em dinheiro. De posse de um IPhone, surge nele e em seu parceiro de cela Dedinho (Ivson Rainero) a ideia de um falso seqüestro, o que que irá aproximar Gago e Leila nessa narrativa original escrita por Márcia Zanelatto. Melhor vista como oportunidade para a tragicomédia, “Hipnose” tem ainda, como demais personagens, a namorada de Gago (Vanessa Galvão), a Gerente de banco (Cecília Hoeltz), o Governador do Estado (Felipe Koury), entre outros.

A direção de Renato Carreira tem o mérito de investir na piada, deixando para o público a tarefa de compreender aquilo que não é nada cômico. Nesse sentido, na medida em que os personagens atravessam o palco e suas histórias vão sendo desveladas, uma réstia de horror vai pouco a pouco dominando o quadro. Com sensibilidade e delicadeza, “Hipnose”, tanto na ordem do texto como da encenação, vai sendo metáfora para um dia a dia em que, muitas vezes, a vida é resultado de situações contrastantes repletas de graça, mas também de tragédias. Com habilidade, os quadros aparecem colados uns por cima dos outros, em cenas curtas e ágeis, de maneira que o ritmo evolui em ótimo balanço crescente entre os protagonismos dos personagens Leila e Gago com boas participações das demais figuras.

Conjunto elogiável de interpretações
Com mais oportunidades de exibir as nuances de seus personagens, são excelentes as interpretações de Carine Klimeck (Leila) e de Hugo Germano (Gago). Eles se destacam em um conjunto que é cheio de bons trabalhos como um todo. Em participações menores, Rodolfo Mesquita (Chico e Advogado) e Cecília Hoeltz (a Gerente de banco Graça) também usam bem os tempos e as sutilezas do texto e da movimentação para devolver construções que bem estruturam o todo com coerência e coesão. No geral, um dos melhores aspectos de “Hipnose” é o fato de que o elenco não se vende ao prazer de interpretar tipos diferentes, mas permite que cada personagem, pequeno ou grande, pareça dono de uma situação que bem poderia ser unicamente sua.

Com força nos diálogos, na construção dos personagens e no desenvolver das ações, a narrativa de “Hipnose” acontece bem sem a participação pesada de cenários e de figurinos. Constituída por poucos elementos, a narrativa talvez tenha aí justificado o bom ritmo. Pelo modo rápido com que as caracterizações apresentam os personagens, o figurino de Maria Duarte deve receber boa avaliação. No mesmo sentido, está a iluminação de Renato Machado que, como sempre, colabora bem com a profundidade do palco e com seu uso de forma criativa. A trilha sonora é de Gustavo Benjão.

Talvez o único senão de “Hipnose” seja o modo aberto demais com que o espetáculo se posiciona socialmente. Ao final da história, o público poderá notar que tudo correu relativamente bem para um dos protagonistas sem que a complexidade da situação do outro tenha sido explorada a contento. Em outras palavras, o espetáculo parte da premissa da exclusão social e fica nela confortavelmente. Fica à audiência um convite à reflexão, o que é sempre uma coisa boa a se fazer.

*

Ficha técnica:
Texto: Márcia Zanelatto
Direção: Renato Carrera
Elenco: Carine Klimeck, Cecília Hoeltz, Felipe Koury, Hugo Germano, Ivson Rainero, Rodolfo Mesquita e Vanessa Galvão.
Figurino: Maria Duarte
Iluminação: Renato Machado
Trilha Sonora: Gustavo Benjão
Produção: Roberta Schneider
Realização: Vil Cia. de Teatro