quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Um lugar chamado Lugar Nenhum (RJ)

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Foto: Robson Sanchez

Rafael Canedo, Guilherme Dellorto e Agatha Duarte


O primeiro texto de Agatha Duarte


“Um lugar chamado Lugar Nenhum” esteve em cartaz entre setembro e outubro no Centro Cultural do Banco do Brasil, na Cinelândia, zona central do Rio de Janeiro. Inspirado na literatura de cordel, esse é o primeiro texto de Agatha Duarte, também atriz do espetáculo ao lado de Rafael Canedo e de Guilherme Dellorto. Com destaque na interpretação desse último, a peça teve direção de Rogério Fanju. Apesar dos enormes problemas de ritmo, tanto no texto como na dramaturgia, o resultado foi positivo. É preciso aplaudir os novos artistas quando eles chegam empenhados em fazer bem um bom trabalho e sem medo de arriscar como aqui é visivelmente o caso. No entanto, é preciso apontar também algumas questões pertinentes. Vamos a elas.

Similaridade com “A máquina”, de Adriana Falcão
A primeira questão relevante acerca de “Um lugar chamado Lugar Nenhum” é sua proximidade gritante com “A máquina”, livro escrito por Adriana Falcão e lançado em 1999. No romance, na pequeníssima cidade de “Nordestina”, moram Karina da Rua de Baixo e Antônio de Dona Nazaré. Eles são dois jovens apaixonados, mas que têm sonhos diferentes. Ela sonha em ir para a cidade grande, ver o mundo e ser atriz. Ele, diferente da maior parte da população do lugar, deseja ficar onde nasceu, junto de sua amada. Para conquistá-la, Antônio resolve trazer o mundo para Karina. Vai para o Sul e lá participa de um programa de televisão, em que promete arriscar a vida e criar uma máquina do tempo. No ano 2000, João Falcão dirigiu a versão teatral com Lázaro Ramos, Wagner Moura, Gustavo Falcão e com Karina Falcão. Em 2006, o filme homônimo foi protagonizado por Gustavo Falcão e por Mariana Ximenes.

Na peça escrita por Agatha Duarte, a história se passa nos 50, no Nordeste, em um pequeníssimo lugarejo chamado “Lugar Nenhum”. O Moço e a Moça são dois jovens apaixonados, mas que têm sonhos diferentes. Ela sonha em ir para o Sul, ver o mundo. E vai. Ele, diferente da maior parte da população do lugar, deseja ficar onde nasceu, junto de sua amada, mas parte atrás dela. Na cidade grande, ele participa de um programa de rádio, cuja transmissão ele quer levar à sua terra. O final é muito parecido com aquele visto em “A máquina”.

Problemas no texto e na direção
O texto, mas também a direção de Rogério Fanju, tem problemas de ritmo. “Um lugar chamado Lugar Nenhum” tem uma história, isto é, seus personagens aparecem principalmente pelo modo como se opõem através do tempo e do espaço. Nesse sentido, a poesia, que relaciona a dramaturgia ao Nordeste, à literatura de cordel e ao espaço imaginário, é um elemento forte, mas não o mais importante. Afeiçoado demais às rimas, o espetáculo infelizmente ficou enrijecido. (Rimas são consideradas pobres quando as palavras do verso são de mesma classe gramatical. Esse é o caso aqui.)

As cenas são longuíssimas e todo o movimento narrativo parece esbarrar nas falas compridas demais. Os personagens - e a Mãe do Moço é um destaque – se mostram positivamente através da riqueza nas imagens oferecidas nos diálogos. No entanto, suas descrições ocupam o lugar da ação atravancando o caminho, que já é previsível por si só. 

Guilherme Dellorto tem destacável trabalho de interpretação
Agatha Duarte (a Moça) e Rafael Canedo (o Moço) apresentam bons trabalhos de interpretação com graça, jovialidade e carisma bem atribuídos aos seus personagens. No entanto, no grupo, Guilherme Dellorto se destaca pela viabilização dos diferentes tipos que ele interpreta, pois, em todos eles, há vibrante aproveitamento das oportunidades. O Radialista, a Mãe, o Velho e o Aproveitador são figuras que celebram a evolução da narrativa e acabam se responsabilizando pelos melhores pontos no ritmo. Duarte e Canedo, ainda que sejam os protagonistas, têm personagens com menores possibilidades, bastante enrijecidos dentro do texto e da concepção da direção.

“Um lugar chamado Lugar Nenhum” tem discreta participação do cenário de José Dias, da luz de Leysa Vidal e do figurino de Daniele Geammal. Nos três aspectos, houve pouco investimento quanto às possibilidades expressivas de formas, contornos e e texturas possíveis. Há uma cansativa exploração dos tons terrosos (que acaba por auxiliar no destaque de Dellorto, que veste prata) e pouca exploração do espaço cênico. A trilha sonora de Roberto Bahal é encantadora e traz qualidades principalmente ao aspecto lírico do texto de Agatha Duarte.

“Um lugar chamado Lugar Nenhum” há de ser o primeiro de vários espetáculos desse coletivo cujo trabalho já começou.


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Ficha Técnica

Patrocínio: Fundação Cesgranrio

Direção: Rogério Fanju

Dramaturgia: Agatha Duarte

Elenco: Rafael Canedo, Agatha Duarte e Guilherme Dellorto

Cenografia: Zé Dias

Iluminação: Leysa Vidal

Figurino: Daniele Geammal

Direção Musical: Roberto Bahal

Direção de Produção: Robson Sanchez

Programador Visual: Johnny Ferro

Preparação Corporal: Sandra Prazeres