sexta-feira, 22 de abril de 2016

Camarão azul (RJ)

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Foto: divulgação

Nelson Yabeta e Zeca Richa

Boas intenções desarticuladas

“Camarão azul” termina sua segunda temporada no próximo domingo, dia 24 de abril. Com vários problemas, a peça tem texto, direção e trilha sonora de Rogério Blat em que tentam se salvar as boas interpretações de Nelson Yabeta e de Zeca Richa. Com interesse em discutir uma série de questões filosóficas de física quântica à fenomenologia, passando pelas relações contemporâneas, o espetáculo tem concepção estética confusa e resultado bastante negativo. O pior é a iluminação de Tiago e de Fernanda Mantovani que agride os olhos do espectador principalmente na parte final da encenação. Depois da temporada no Sesc Tijuca, a peça está desde o início de março no Parque das Ruínas, em Santa Teresa, no Rio de Janeiro.

Nem teatro para crianças, nem ficção científica
Na primeira parte do texto de Rogério Blat, dois astronautas estão no espaço desempenhando uma missão em nome do governo. Um deles (Nelson Yabeta) é um oficial experiente que coloca o patriotismo acima de tudo apesar de revelar valores morais pouco nobres. O outro (Zeca Richa) é um físico que está em sua primeira viagem além da Terra. Sua tese está sendo analisada e ela pode auxiliar o governo em projeto de seu interesse. A história começa quando uma conversa despretensiosa entre os dois acaba por ressaltar suas diferenças. Uma briga inicia e as intervenções da base, que observa os dois viajantes, começam a ficar mais tensas.

Na segunda e terceira parte do espetáculo, a situação inicial é desmascarada. O espectador fica sabendo qual é o contexto real do encontro entre os dois personagens, ganha novas chances de reavaliá-los e conhece o desenlace da narrativa. A direção de Rogério Blat sobre seu próprio texto, porém, não percorreu os melhores caminhos de valorização da dramaturgia. A peça não revela reflexão suficiente sobre as bases estéticas que nortearam sua concepção.

Uma peça sobre uma viagem espacial ou é teatro para crianças ou é alguma narrativa relacionada à ficção científica. Os dois caminhos têm referências estéticas já bastante solidificadas no imaginário. No Brasil, todo o repertório cultural que trata do assunto “viagens espaciais” remete aos filmes de Hollywood e à NASA (Quase ninguém ouviu falar da AEB – Agência Espacial Brasileira). O primeiro é uma indústria de ficção dos Estados Unidos e o outro é um órgão do governo americano responsável pela administração de projetos de exploração espacial.

Um emaranhado de objetos de plástico de baixa qualidade e luzes de LED de lixo tecnológico (expressão utilizada na divulgação da peça) não tem poder suficiente para construir um realismo capaz de levar o espectador ao fantástico. Desde o início, os diálogos de “Camarão Azul” revelam que também não se trata de teatro para crianças. Ou seja, todas as marcas visuais (os signos estéticos: as cores, as formas, as texturas, a relação disso tudo com o além de peça, etc) do espetáculo entram em conflito negativamente com o texto. Do início ao fim, paira uma impressão negativa: a de que se está vendo um espetáculo enjambrado.

Boas atuações naufragam em contexto insólito
A luz de Tiago e de Fernanda Mantovani piora o resultado estético do espetáculo sobretudo porque suas reais intenções se mostram duvidosas. A divulgação da peça fala em minimalismo e em desconforto a fim de exibir um comportamento mais ativo do público durante a fruição. Mas, no palco, a escuridão mais parece um meio de esconder as deficiências do cenário. Tudo fica ainda mais difícil quando luzes potentes piscam completamente viradas para o público (e não para o palco), turvando seu olhar durante um longo tempo. Aí “Camarão Azul” parece buscar subterfúgios teóricos para justificar suas falhas, gesto pouco respeitoso porque descaracteriza a inteligência da audiência.

As interpretações de Nelson Yabeta e de Zeca Richa sofrem diante de contexto tão insólito. Os dois atores dizem bem o texto, buscam clarear as intenções de suas falas, defendem bem seus personagens em cada quadro da narrativa. O problema é que eles são vistos em meio a todo o resto e seus esforços não são o bastante para dar conta de tudo. É uma pena.

“Camarão Azul” pode ser um conjunto de boas intenções que não se articulam em um quadro que as valorize. Falta um olhar sobre o todo da obra que esteja sensível ao processo de construção do seu sentido. A refletir!

*

Ficha técnica:
Dramaturgia e Direção: Rogério Blat
Elenco: Zeca Richa e Nelson Yabeta
Preparação de atores: Ricardo Blat
Direção de Produção: Ronaldo Tasso
Fotos: Trívia Produções
Trilha sonora: Rogério Blat
Identidade Visual: ZR Mosaico
Operador de som e contrarregragem: José Milton Damasceno
Iluminação: Tiago Mantovani e Fernanda Mantovani.
Vozes: Ricardo Blat
Assistente de Produção: TJ Bastos
Produção: rtasso Ideias e Realizações
Assessoria de Imprensa: Minas de Ideias