sexta-feira, 8 de abril de 2016

Hilda e Freud (RJ)

Curta nossa página no Facebook: www.facebook.com/criticateatral
Siga-nos no Instagram: @criticateatral

Foto: divulgação

Antônio Quinet e Bel Kutner

Monótono

O monótono “Hilda e Freud” saiu de cartaz do Teatro Maison de France no último dia 27 de março. Com texto de Antônio Quinet e direção dele e de Regina Miranda, a montagem traz ele no elenco ao lado de Bel Kutner. A história está baseada nos diários e nas obras correlatas da poetisa americana Hilda Doolittle (1886-1961) sobre os reflexos de sua terapia e amizade com Sigmund Freud (1856-1939). Incapaz de despertar qualquer conexão com a plateia, o espetáculo paira absorto em um universo mal defendido. É uma pena!

Texto ruim
O texto de “Hilda e Freud” não venceu qualquer um dos seus dois principais desafios: apresentar Hilda e percorrer a relação dela com Freud. Quanto ao primeiro, os personagens chegam à narrativa por meio de apresentações secas em que os intérpretes quebram a quarta parede, dispensando as vantagens do conflito e de algum outro esforço estético. Embora tenha ganhado reconhecimento nos anos sessenta e setenta na Europa, a poesia de Hilda Doolittle ou mesmo as reflexões da escritora sobre o período em que ela conviveu com o psicanalista Sigmund Freud não chegaram até nós suficientemente. Por isso, sua introdução se torna essencial e sua não realização a contento problemática.

Na peça, a personagem Hilda chega ao consultório de Freud como sendo uma escritora em bloqueio criativo e com dificuldades de lidar com sua sexualidade. Diante dela, o pai da psicanálise - já velho e doente - está testemunhando como judeu uma Áustria cada vez mais dominada pelo horror do nazismo alemão. Sem equilibrar na ficção essas duas figuras do mundo real, com interesses e realidades tão distintas, em um recorte dramático interessante, a dramaturgia coloca sua protagonista em lugar bastante insólito.

A relação entre os dois também quase não evolui. De um modo geral, o texto é muito pouco dramático: sem ações físicas, nem movimentos internos. Os personagens falam de si, de seus pensamentos e reflexões, mas nem um deles parece realmente se transformar. Como também apontaram os críticos Renato Mello e Leonardo Torres, o texto de Quinet, se atende bem a uma proposta acadêmica, é monótono demais para o contexto teatral. E, por isso, o público dorme longamente.

Méritos na interpretação de Bel Kutner
Se há algum aspecto a ser elogiado na obra é a interpretação de Bel Kutner (Hilda) cujos esforços em dar movimento para a peça são o único oxigênio da encenação. Nesse trabalho, seus méritos como atriz devem ser medidos a partir das dificuldades que ela parece ter tido em mãos. A interpretação de Antônio Quinet (Freud) é inexpressiva, oferecendo impulso muito limitado para a transformação na contracena. Mesmo assim, a atriz consegue dar a ver curvas capazes de fazer a história andar. Isso deve ser valorizado.

A direção de Antônio Quinet e de Regina Miranda parece de mãos atadas diante da dificuldade do texto. A falta de mobilidade não se torna positivamente um aspecto estético aqui, como em Beckett, para citar um bom exemplo. Ao contrário, ela impõe ao ritmo de modo negativo barreiras intransponíveis, como também acontece nos diálogos de Platão ou nas peças de Sêneca, para citar outros dois.

O cenário de Analu Prestes colabora com a beleza do quadro cênico, mas quase nenhuma informação acrescenta à narrativa. O figurino de Beto de Abreu é comedido, apresentando os personagens com o mínimo necessário infelizmente. O desenho de luz de Fernanda e de Tiago Mantovani e as projeções em vídeo das Mídias Organizadas, com enorme responsabilidade, melhoram o ritmo, oferecendo diferentes sutilezas à evolução das cenas. A trilha sonora de Regina Miranda sobre a obra de Rodolfo Caesar age no mesmo sentido positivamente.

Boas intenções
Apegado à mitológica recriação da realidade, considerando que os encontros entre Hilda e Freud realmente existiram, e ao pensamento do grande psicanalista, a obra se distancia do público. E paira interminavelmente monótona em um lugar distante. Com certeza, os dois personagens merecem melhores investidas da produção teatral carioca.

*

FICHA TÉCNICA
Texto: Antonio Quinet
Elenco: Bel Kutner e Antonio Quinet
Direção: Antonio Quinet e Regina Miranda
Direção de arte e cenografia: Analu Prestes
Videocenografia: Mídias Organizadas
Iluminação: Fernanda Mantovani e Tiago Mantovani
Trilha Sonora: Regina Miranda sobre a obra de Rodolfo Caesar, Alberto Iglesias e Philip Glass Ensemble
Figurino: Beto de Abreu
Visagismo: Uirande Holanda
Preparação vocal: Rose Gonçalves
Fotografia: Flavio Colker
Programação visual: Mary Paz
Assessoria de imprensa: Lu Nabuco Assessoria em Comunicação
Comunicação em mídias sociais: Radha Barcelos
Direção de produção: Alice Cavalcante
Assistência de produção: Luísa Reis
Co-produção: Sábios Projetos e Atos e Divãs
Realização: Cia Inconsciente em Cena