sexta-feira, 8 de abril de 2016

Orpheus (SP)

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Foto: divulgação


Vera Lafer

A rápida e bela passagem de “Orpheus” pelo Rio de Janeiro

“Orpheus” é o mais novo espetáculo da paulistana Studio3 Cia. de Dança. Coreografada por Anselmo Zolla e dirigida por José Possi Neto, a produção fez única apresentação na última terça-feira, 29 de março, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Através da dança contemporânea, o grupo adaptou o mito de Orfeu e de Eurídice, utilizando composições musicais do alemão Christoph Glück (1714-1787) e dos brasileiros Tom Jobim (1927-1994) e Felipe Venâncio. Os bailarinos Alexandre Nascimento, Jefferson Damasceno, Beth Risoleu, Vera Lafer e a atriz convidada Marilena Ansaldi, de 81 anos, se destacam no elenco constituído por vinte integrantes. São exuberantes ainda o cenário da Casa Goia e os figurinos de Fábio Namatame. A peça, que já cumpriu duas temporadas em São Paulo, vai se apresentar no Teatro des Champs Elysées em Paris.

O mito grego e sua célebre primeira versão brasileira
As mais antigas citações do mito grego de Orfeu e Eurídice que temos hoje são as narrações em “Geórgicas”, de Virgílio (70 a.C. – 19 a.C.), e em “Metamorfoses”, de Ovídio (43 a.C. – 18 d.C.). Nesses textos latinos, a história é descrita com algumas diferenças, mas com uma base comum. A morte trágica de Eurídice, assassinada por Aristeu, no dia do seu casamento com Orfeu, trouxe ao noivo uma grande tristeza. Por amor, ele vai ao Hades tentar resgatá-la do Reino dos Mortos. Lá, com a música de sua lira, encanta a todos, inclusive a Rainha Perséfone, que concorda em permitir que Eurídice retorne ao Olimpo, mas impõe uma condição: no trajeto de volta, Orfeu não poderá vê-la. Fatalmente, ao levantar-se de um tropeço, os olhos dos dois se cruzam e a amada volta definitivamente para o Hades. Por sete anos, Orfeu chora e, em sua dor, não olha para nenhuma outra mulher. Inconformadas, as bacantes esquartejam o herói e, na morte enfim, ele volta a se encontrar com a esposa, vivendo com ela para sempre.

Em 1954, Vinícius de Moraes escreveu a peça “O Orfeu da Conceição” que, dois anos depois, estreou no Theatro Municipal do Rio de Janeiro com músicas de Tom Jobim. Nessa versão, Orfeu e Eurídice são moradores de uma favela carioca. Ela é assassinada na véspera de seu casamento e, desesperado, ele desce para um baile de carnaval na cidade onde se encontra com os reis momos. A alegria da festa o perturba e, ao voltar, ele se encontra com a Dama Negra, antes de ser morto pelas prostitutas rejeitadas. Em 1959, “Orfeu do Carnaval”, a versão cinematográfica da peça, ganhou vários prêmios pelo mundo, incluindo o Globo de Ouro e o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

Espetáculo brilhante!
“Orpheus” se utiliza dos movimentos mais sutis às coreografias mais arrojadas para exibir sua pesquisa no universo mitológico. Com sucesso, o espetáculo inclui a reflexão de que o amor ainda existe e tem força mesmo nesses tempos árduos em que vivemos. Ao longo das cenas, o sentimento vai ganhando expressões cada vez mais fortes e sua abordagem substitui a importância da narrativa. Em outras palavras, não se precisa conhecer a história de Orfeu e de Eurídice para se vivenciar essa experiência estética. As coreografias de Anselmo Zolla e a direção teatral de José Possi Neto são bastante meritosas nesse sentido.

Os bailarinos Alexandre Nascimento e Jefferson Damasceno protagonizam um belíssimo duo, revelando talvez que amor e masculinidade não são oposições. Marilena Ansaldi, contribuindo com poesia, formas delicadas e expressões marcantes, dá vida a Orpheu apaixonadamente em busca de sua amada. Vera Lafer e Beth Risoleu trazem duas visões sobre Eurídice, ambas expressas em traços pontuais e limpos de enorme beleza. Todo o elenco colabora para quadros ricos em detalhes e que, bem articulados, participam com detalhes na construção do sentido de toda a obra.

A cenografia da Casa Goia e os figurinos de Fábio Namatame oferecem aos bailarinos-intérpretes renovadas chances de brilhar em grandes trabalhos. No desenvolver da narrativa, o palco vai se transformando em oportunidades cada vez mais belas de se fruir o espetáculo. Sem privilégio nem à plástica, nem ao cênico, tampouco à sonoridade, “Orpheus” envolve bem todos os signos em um discurso coeso e coerente bem estruturado. A direção musical de Felipe Venâncio e a iluminação de Zolla, Possi Neto e de Joyce Drummond conseguem igualmente ótimos resultados.

Por uma temporada no Rio
“Orpheus”, de Anselmo Zolla e de José Possi Neto com o Studio3 Cia. de Dança, é um belo espetáculo. Oxalá depois da França haja oportunidades mais longas do público carioca aplaudi-lo.

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FICHA TÉCNICA
Com a Studio3 Cia. de Dança e a bailarina Vera Lafer
Artista convidada: Marilena Ansaldi
Ideia e Direção coreográfica: Anselmo Zolla
Direção teatral: José Possi Neto
Coreografia: Anselmo Zolla e elenco de Intérpretes criadores
Roteiro: José Possi Neto
Direção musical: Felipe Venâncio
Músicas: Christoph Gluck, Tom Jobim e Felipe Venâncio
Participação em voz: Zizi Possi e Tiganá Santana
Letras: Vinicius de Moraes
Cenografia : Casa Goia
Imagens: Karina Machado
Desenho de luz: José Possi Neto, Anselmo Zolla e Joyce Drummond
Figurinos: Fabio Namatame
Vídeo/ cenário: Estúdio Preto e Branco
Trechos do poema Paulicéia Desvairada de Mario de Andrade
Relações Públicas/ Convidados: Liège Monteiro e Luiz Fernando Coutinho
Assessoria de Imprensa: Liège Monteiro e Luiz Fernando Coutinho