quarta-feira, 20 de julho de 2016

Tudo o que há Flora (RJ)

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Foto: divulgação


Thiago Marinho, Leila Savary e Lucas Drummond

Primeiro espetáculo da Nossa! Cia. de Atores é excelente!


“Tudo o que há Flora”, um dos melhores espetáculos em cartaz no Rio de Janeiro, é a primeira produção da Nossa! Cia. de Atores. Com belíssimo texto escrito por Luiza Prado, a montagem é dirigida por Daniel Herz, esse mais uma vez em excelente trabalho. No elenco, Lucas Drummond, Thiago Marinho, Jorge Renato e Leila Savary, com destaque para essa última, dão vida a uma situação absurda que pode desvendar a solidão no mundo contemporâneo. Antônio Guedes, Fernando Mello da Costa, Aurélio de Simoni e Pablo Paleologo são outros grandes nomes cujos elogios às contribuições se estendem ao figurino, cenário, iluminação e à trilha sonora aqui. A temporada vai até o dia 24 de julho no Teatro III do Centro Cultural do Banco do Brasil. Imperdível.

Excelente dramaturgia!
Um rebuscado jogo de palavras apresenta os personagens. Flora (Leila Savary) é casada com Armando (Jorge Renato), mas ele não está em casa. Em sua ausência, ela recebe seus dois amantes (Lucas Drummond e Thiago Marinho), que são irmãos. Quando a peça começa, um fica sabendo da existência do outro e, durante quase toda a narrativa, há uma disputa entre ambos sobre quem ficará com a protagonista, cujo marido está para chegar. O modo como o discurso acontece no interior de cada diálogo, porém, vai deixando mais claras algumas pistas preciosas que revelam que nem tudo é como parece. E é esse o maior mérito de “Tudo o que há Flora”.

Tratam-se de diálogos quase barrocos. Lembrar e esquecer, presença e ausência, ação e inércia e muitas outras oposições similares vão enredando o espectador nas falas. Ele se diverte com algo que, de início, talvez não consiga reconhecer com facilidade, o que mantém seu interesse para além de todos os ótimos aspectos visuais em sua frente. No final, a problemática ficará clara. Flora luta contra a solidão que é consequência de um acontecimento trágico. Afogada na convivência doméstica com um aspirador e uma enceradeira, ela foge do luto.

De um modo muito inteligente, a dramaturgia original de “Tudo o que há Flora”, de Luiza Prado, conversa com o belíssimo texto de “Luisa se estrella contra su casa”, do argentino Ariel Farace. Essa peça já se apresentou algumas vezes no país, cumprindo uma pequena temporada no Festival Dois Pontos em março do ano passado. O portenho, em que a protagonista conversa com o sapólio Odex, investe mais na linha existencialista de Clarice Lispector. Prado vai para o absurdo.

Desde Martin Esslin, sabe-se que absurdo é um termo teórico pouco consensual que tenta unir dramaturgias diferentes a partir do modo como elas propõem uma leitura sobre a falta de lógica no mundo. As situações, desvinculadas do padrão realista, se eximem de organizações de causa e de efeito e fazem disso uma metáfora. Prado, inegavelmente muito inspirada no romeno Eugène Ionesco (1909-1984), não faz da comédia um alívio para o drama, mas um meio pelo qual ele é potencializado. Daí, em termos de dramaturgia, eis um grande motivo para o sucesso que o seu texto tem feito desde que “Tudo o que há Flora” estreou.

Leila Savary brilha!
Na direção, Daniel Herz valoriza cada informação em um amplo processo de exploração de seus níveis semânticos. As entradas, as saídas e as presenças de cada personagem são cobertas de propostas que, com coragem, se abrem com força à cena. A peça não é fácil, mas a falta de acessibilidade é compensada pela enorme beleza dos quadros. Dessa maneira, quando os pontos conseguem ser de um modo geral unidos, o resultado é belíssimo.

O ritmo, outro grande mérito de Herz, é garantido sobretudo pelo nobre conjunto de atuações. Jorge Renato (o marido Armando), nas oportunidades mais modestas que tem, ressalta o elogio à valorização dos detalhes. Lucas Drummond e Thiago Marinhom (os Amantes), em ótimo jogo entre si, são a base essencial sobre a qual vai Leila Savary (Flora) brilhar. Nesse trio, os movimentos de corpo e de voz agem de modo a elevar os valores estéticos da obra a partir de intenções ricamente exploradas. Savary, em precioso destaque, articula suas expressões em sublime alternância, o que, no âmbito das interpretações, faz a sua parte na viabilização das oposições já elogiadas na dramaturgia. Excelente!

O sucesso “Tudo o que há Flora” passa pelas inteligentes contribuições do figurino de Antônio Guedes, do cenário de Fernando Mello da Costa, da iluminação de Aurélio de Simoni e da trilha sonora de Pablo Paleologo. Cada um desses elementos, nas suas amplas possibilidades, colabora com a construção de um quadro cheio de profundidade cuja beleza é fácil de ver.

Sucesso!
A Nossa! Cia. de Atores, em sua primeira produção, permite ao Rio de Janeiro se orgulhar de seus jovens realizadores. O espetáculo é digno dos vários elogios que tem recebido da crítica e do sucesso de bilheteria. Parabéns!

*

FICHA TÉCNICA: Tudo o que há Flora
Texto: Luiza Prado
Direção: Daniel Herz
Elenco: Leila Savary, Lucas Drummond e Thiago Marinho
Ator convidado: Jorge Medina
Produção: Palavra Z Produções Culturais
Coprodução: Raposo Produções
Direção de Produção: Bruno Mariozz
Figurino: Antônio Guedes
Cenário: Fernando Mello da Costa
Iluminação: Aurélio de Simoni
Trilha Sonora: Pablo Paleologo
Supervisão de Movimento: Janice Botelho
Visagismo: Talita Bildeman
Fotografia e Vídeo: Paulo Henrique Costa Blanca
Idealização: Nossa! Cia. de Atores

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