quarta-feira, 6 de julho de 2016

Urgente (MG)

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Foto: divulgação

Cláudio Dias, Marcelo Souza e Silva, Odilon Esteves e Isabela Paes

Preocupado em parecer inteligente

“Urgente” comemora mal os 15 anos da célebre companhia mineira Luna Lunera. Com direção de Miwa Yanagizawa e de Maria Sílvia Siqueira Campos, integrantes da carioca Areas Coletivo de Arte, a peça falece em meio a uma ingrata responsabilidade filosófica e se distancia da plateia. Na história, em algum lugar da segunda metade do século XX, um homem se muda para um velho prédio de apartamentos minúsculos, passando a conviver com seus moradores. As histórias de todos se cruzam atravessadas pelo risco de desabamento do edifício. O tema é a subjetividade na sensação da passagem do tempo: a desvalorização dos momentos presentes versus a necessidade de resgate do passado na ressignificação do futuro. Enquanto paira a pinta de “peça cabeça”, as cenas se perdem em diálogos enormes, personagens mal escritos e ritmo cambaleante. Cláudio Dias, Isabela Paes, Marcelo Souza e Silva, Odilon Esteves e Zé Walter Albinati estão no elenco na montagem que fica em cartaz, no Teatro II do Centro Cultural do Banco do Brasil, na Cinelândia, até 8 de agosto.

Problemas na dramaturgia
A peça começa quando Zé Walter Albinati, interpretando um Zelador, vem ao proscênio e expõe para o público todos os acontecimentos do espetáculo que está para iniciar. De um modo muito interessante, esse discurso abandona, aos poucos, feições mais descritivas e frias e atinge uma poética que marca a introdução da narrativa. O feito vale ainda para pautar o assunto: a valorização do presente, do atual, que é tão cara a reflexões mais complexas do mundo contemporâneo.

No palco, veem-se Cláudio Dias, Marcelo Souza e Silva e Isabela Paes, que interpretam um Carnavalesco, um Administrador e uma Costureira. Eles são vizinhos de porta no velho edifício onde se passa a história. Com a entrada do personagem de Odilon Esteves, algo além de uma mera circunstância espacial começa a se esforçar para unir as figuras.

As melhores intenções do texto, que é assinado pelos grupos Areas Coletivo de Arte e Cia. Luna Lunera, ruem quando o esforço da dramaturgia em expressar profundidade fica grande demais. Lá pelas tantas, os diálogos começam a ficar recheados de frases complexas, o passado e o presente dos personagens ficam meramente descritivos e o único fato realmente dramático é pouco aproveitado. Ei-lo: o condomínio exige que os moradores mantenham atualizados seus exames audiométricos porque rachaduras enormes avisam do perigo imanente do prédio desabar. Assim, só a capacidade de atenção ao alarme sonoro poderá salvá-los quando isso vier a acontecer. Um dos personagens está ficando surdo e a notícia disso garante alguma atenção que sobrevive à presunção das cenas centrais da narrativa. O fim, no entanto, é frustrante, pois a oportunidade mais rica de toda a narrativa cênica é substituída por um par de frases que pobremente pensa dar conta dela.

Para piorar, ao longo da peça, cada intérprete ganha um momento no proscênio para narrar ao público, por dois minutos, acontecimentos marcantes de sua vida. A opção barateia o contemporâneo, transformando em código aquilo que é um conceito. E falha na intenção de desenvolver o tema da atualidade quando o personagem que está ficando surdo não ouve o sinal de vir à frente e fica, por isso, com menos tempo que seus colegas. Ora, se as histórias contatadas pelos intérpretes se pautam pelo esforço de parecerem real, a invasão de uma característica do personagem nesse momento avisa para o público que tudo é de mentira.

Bela participação dos elementos sonoros e visuais
A direção de Miwa Yanagizawa e de Maria Sílvia Siqueira Campos cava imagens visuais e sonoras bonitas como centenas de moedas caindo no chão, um velho piano quebrado e como um passo de carnaval entre outras. Ela não resolve, porém, os problemas maiores do texto – que foi construído na sala de ensaio, segundo o release da produção. Isabela Paes (a Costureira), Marcelo Souza e Silva (o Administrador) e Zé Walter Albinati (o Zelador) dão vida a seus personagens de modo regular demais e pouco interessantes: sem variações na entonação nem nos corpos. Sobre Silva e Albinati, a situaçãoo fica ainda mais complexa porque suas figuras são meramente presenciais, isto é, com limitadíssimas funções na narrativa. As melhores oportunidades a Paes não foram bem aproveitadas.

Cláudio Dias e Odilon Esteves, que interpretam os irmãos que se reencontram, detêm a posse das figuras mais ricas da narrativa, apesar de suas histórias pouco se relacionarem com a grande questão de “Urgente”. Os dois atores apresentam trabalhos muito interessantes, oferecendo níveis variáveis de defesa que nutrem o espetáculo positivamente.

Assinada pela banda Constantina, a ambientação sonora da peça faz excelente colaboração ao lado do figurino e principalmente do cenário de Yumi Sakate e da Areas Coletivo de Arte. Ao lado da luz de Felipe Cosse e de Juliano Coelho, esses elementos, no modo como estão detalhadamente articulados, elevam as potencialidades estéticas da produção.

15 anos da Cia. Luna Lunera
“Urgente”, esforçado em exibir preocupação com uma questão filosófica contemporânea, paira pretensioso e isolado longe do público. É uma pena.

*

Ficha técnica:
Direção: Miwa Yanagizawa e Maria Sílvia Siqueira Campos
Assistente de direção: Liliane Rovaris
Texto: Areas Coletivo de Arte e Cia. Luna Lunera
Interlocução dramatúrgica: Carlos de Brito e Mello e Liliane Rovaris
Elenco: Cláudio Dias, Isabela Paes, Marcelo Souza e Silva, Odilon Esteves, Zé Walter Albinati
Ambientação sonora: Constantina
Cenário: Yumi Sakate e Areas Coletivo de Arte
Cenotécnicos: Henrique Fonseca e Alexandre Silva
Figurino: Yumi Sakate
Criação de Luz: Felipe Cosse e Juliano Coelho
Criação Gráfica: Estudio Lampejo
Fotografia: Carol Thusek e Raquel Carneiro
Assessoria de comunicação: Luísa Lóes
Produção executiva: Aristeo Serranegra
Assessoria administrativa: Vinícius Santos
Gestão financeira: Graziane Gonçalves
Coordenação de produção: Larissa Scarpelli

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